Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Política

Existe realmente o perigo comunista no Brasil?


25/03/2024

É frequente nas discussões políticas no Brasil, a reação dos que militam na direita propagando a permanente ameaça de que o Brasil pode virar uma nação comunista. Foi assim que os promotores do Golpe de 64 justificaram a derrubada do governo democrático de João Goulart, acusando-o de firmar alianças com líderes internacionais de esquerda. A mesma coisa vem sendo dita desde que o Partido dos Trabalhadores se inseriu na política nacional. Na falta de argumentos, o principal revide nos debates é de que Lula quer implantar o comunismo no Brasil. O PT já governou o país por 16 anos e volta agora a governar, e não se viu, nem se vê, qualquer indicativo de verdade nisso. Mas esse argumento perdura até hoje.

Essa onda anti-comunista vem desde a década de 1930, apresentada como única solução para salvar o país dos vermelhos, o comunismo sendo colocado como um perigo interno real. No entanto, o governo Vargas passou a ser interpretado como comunista porque criou uma legislação e estrutura trabalhistas, embora de cunho paternalista, o que motivou a “intentona comunista” de 1935.

Há um evidente esforço para confundir justiça social com comunismo. O historiador Carlos Fico, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em um dos seus escritos sobre o tema, afirmou: “O golpe de 64 não veio para coibir uma tentativa efetiva de implantação do comunismo, muito menos o presidente João Goulart pode ser tido como comunista. Ele era no máximo um reformista”. As reformas de base do governo Jango, eram apontadas pelos militares golpistas como o ponto de ameaça comunista no Brasil.

É sempre assim, as lutas para garantir a democracia, as liberdades e os direitos, são confundidas estrategicamente, pela direita, como “coisas de comunista”. É a velha teoria conspiratória de que o Brasil vive num iminente risco de sofrer uma conversão ideológica. Percebe-se o interesse em criar uma atmosfera de medo e de insegurança na população a esse respeito. Essa falsa ameaça não é nada mais do que uma aversão à democracia. Por isso, de vez em quando, nos deparamos com movimentos em defesa do autoritarismo, pelos saudosistas da ditadura militar.

Certamente, alguns dos que me lêem se apressarao em me qualificar como um comunista. Estou acostumado a isso. É a forma com que reagem, quando não têm argumentos para se contrapor ao ideário de esquerda. Quem não apoiava o discurso antidemocrático do governo passado e dos que estavam nos acampamentos em frente aos quartéis reivindicando “intervenção militar já”, era chamado de comunista. Nunca fui, nem tenho qualquer intenção de ser. Sou contra tanto à esquerda mais radical, quanto à direita reacionária. O comunismo teve fim com a queda do Muro de Berlim, a dissolução da União Soviética e do antigo campo dos Estados socialistas.

Os conservadores da extrema direita costumam associar o anticomunismo ao antipetismo, embora se saiba que o Partido dos Trabalhadores, enquanto governo, tem adotado uma postura moderada, social democrata. Eles consideram o fato do partido admitir símbolo como a cor vermelha da estrela em sua bandeira, como indicação de que esteja alinhado com a ideologia comunista. Sim, é inegável que é um partido de esquerda e de organização das classes trabalhadoras, mas não atua como uma força política que intenta implantar um regime comunista no país.

O anti-comunismo está internalizado nas Forças Armadas politizadas e partidarizadas. E disso se fez proveito para o movimento golpista que culminou com a barbárie de 08 de janeiro de 2023, quando invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes. Quando dizem que o inimigo é o comunismo, eu digo que, na verdade, para eles, o inimigo é a democracia. Toda vez que se instala um governo progressista essa retórica volta com força. A tradição anti-comunista brasileira alimenta essa onda direitista no país.


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