Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

Chico Buarque


12/01/2016

Foto: autor desconhecido.

Quando ouvi a A Banda, cantada pelo seu autor Chico Buarque, um rapazinho de olhos cor de ardósia, literalmente vibrei assim junto com as cornetas da banda da criança de cada um. Estava à toa na vida….e desde então virei fã. Mas não só. Virei consumidora de tudo de Chico Buarque. Sua música, ideias, comportamento, posição política, cidadã, viajante, e mais recentemente literária. Comprava todos os LPs no escuro, e ganhava de aniversário também. Cantei todas as músicas frenéticamente. Olhos nos Olhos! E assim como toda a população brasileira, vivi com essa trilha. De Olés e Olás. E chorava com Os Mascarados – quem é você diga logo logo!!!

Quando estava Alegre, cantarolava Mambembe; triste, as músicas de abandono; de fossa? Perdi as contas: separação, Folhetim foi meu hino! Rancor? Toda a trilha de Gota D´água; Amor? O Meu Amor; traição?: Perdoa-me por te traíres; e assim por diante. Mais recentemente fui assistir ao seu show em Recife, na véspera do de Paul McCartney. E realmente quase morri de dose dupla e todos os excessos de alegria e felicidade.
Outro dia, fui assistir ao documentário, “Chico, Artista Brasileiro”, de Miguel Faria Jr., em meio às polêmicas de brigas, reações ao fato de Chico se posicionar publicamente suas opiniões políticas e partidárias. Tudo no maior absurdo de intolerância. Comprei o Cd antes do filme e fiquei rouca de cantar Mambembe! Antes do escurinho do cinema.

O cenário do show que dá início ao documentário composto de cores em placas de vermelho e amarelo; acho que Mondrian foi a inspiração. E ai o filme acontece por entre algumas interpretações de músicas pinçadas para contar alguns dos momentos da vida de Chico, entrecortadas com sua fala leve, bem humorada, sarcástica/inocente, de pilhérias, e opiniões sobre tudo. O próprio diretor falou em entrevista a Roberto Dávila (Globo News) que, quis assim, continuar o que antes já havia feito com o filme “Vinicius”, que contava a trajetória de Vinicius de Moraes e assim da música brasileira até os anos 60, e queria prosseguir. E quem melhor que Chico para representar a música, a imaginação e a memória musical, afetiva e social desse tempo todo nosso? A melhor imagem desses tempos tão ricos? Uma foto de Chico, Tom e Vinicius, deitados numa mesa num bar/restaurante que frequentavam na época. Lindos!

Chico fala da família, do pai, dos livros que leu, das línguas que aprendeu , das turmas, de Ipanema, dos parceiros da profissão, do casamento e separação com Marieta Severo, das filhas, dos netos, da música de antes e da de hoje, do exílio na Itália, de como constrói suas letras, harmonias, músicas, livros; da solidão, dos amores, dos assuntos todos…Fala da mãe e de como ela cantarolava Noel Rosas. Lembrei logo da minha mãe também que cantava na cozinha “Esse amor que eu não esqueço, e que teve seu começo….”

Um homem elegante! Que beleza o que falou da ex-mulher! E que emoção ouvir Hugo Carvana falando do seu primeiro olhar para a amada – Olhou para ela como se se perguntasse onde teria andado até aquele momento?

Chico falou que gosta da solidão; que seu trabalho exige isso e que, depois de viver sozinho por mais de 20 anos, não se vê de outra forma. Imagino que moças oferecidas não faltaram! Ah! Quem me dera! Me identifiquei com esse seu sentir, pois também gosto muito de viver sozinha. Se as minhas circunstâncias tivessem sido outras, é claro!

Que delícia ouvi-lo falar de “A Rita”, que cantei muito em todas as horas. Ou de “Essa moça tá diferente”. “Apesar de você”, me faz chorar. Comprei o compact às vésperas de viajar para os Estados Unidos em 1971. Logo depois foi proibido. E eu lá em Ohio, com essa relíquia, cantava – amanhã vai ser outro dia…, e chorava saudosa de casa e de Chico. E quando voltei, 7 meses depois, chorava com saudade dos States e do que essa música me remetia ao meu exílio autorizado de adolescente que queria ver o mundo. Hoje vai ser outro dia! Foi trilha para os tempos sombrios, os meus inclusive.

E os Festivais? Sabiá, vaiada na época, e tocante no filme, cantada pela portuguesa Carminho. Fiquei viajando nas minhas memórias assistindo a todos os Festivais, tão menina ainda, 12 /13 anos de idade e já cantarolando Disparada, Ponteio, participando de um momento histórico tão importante, mesmo que não soubesse ainda a dimensão do que seria uma ditadura, censura, exílio, etc. No final da década de sessenta éramos amadurecidos na marra, e gostávamos de coisas inimagináveis, como ouvir canções de protesto, comparando ao (des)gosto hoje com tanto forró de plástico. Mas quanto a isso Chico também se posiciona falando da Bossa Nova, como um movimento da classe média alta carioca, e de como a música reflete o momento da sociedade. Entreguemos ao destino pois, ao que por vezes, prepotentemente, teimamos em chamar de mau gosto!

Ouvir Calabar, Roda Viva, Gota D´água, me levam ao Rio de Janeiro. Final dos anos 70. Levei um tombo na porta do Teatro, Medéia me fazia chorar. Somente um Dia!! Basta um dia. Ruy Guerra, aqui na minha casa, Ed. Gravatá – Tanto Mar!! Eu quero ir embora , Sou Ana de Amsterdam! Os tempos da Barra da Tijuca, casa de Anne Marie e Flávio Bruno. O vizinho e músico Neville, que há anos não via e o re-vi no filme, cantando com Chico e toda a turma do futebol. O que será que será??? Que dá dentro da gente e não devia. Bem entendo do incontrolável! Do Avassalador! Do Inexorável!

As músicas de Chico se misturam às nossas vida. Olhos nos Olhos! Chico, Julinho Adelaide! Quanta ironia no seu pseudônimo. Você não gosta de mim, mas sua filha gosta! Tempos do Geisel! E eu, com toda autoridade cantarolava! Pois mal sabia que esse nome , anos mais tarde ficaria marcado amorosamente no meu corpo, feito tatuagem!

Você é homossexual Chico? Pergunta um entrevistador. O poeta é um fingidor. E Chico é tudo. Pode tudo. Pode ser inclusive Sinhá! Com açúcar e com afeto! E Tom o bem definiu: O mundo é cheio de planícies e, aqui e muito acolá, uma montanha. Chico é montanha!

Vamos ao cinema baby?? Mart´Nália e Adriana Calcanhoto me botam para dançar no cinema!! Escrever? É fácil! Basta sentar diante do papel e cortar os pulsos! Chico cita Fernando Sabino. E eu concordo.

E o Irmão Alemão? Da ficção para a realidade e vice e versa! Baioque! Vai passar! Tudo passa. Chico gosta do tempo de hoje. Assim como Paulinho da Viola. Assim como eu! Ele é operário , Ele é marginal, Ele sabe de tudo – Tom disse!

O momento mais triste? Uma Canção Desnaturada, bravamente interpretada pela camaleoa Laila Garin. Vi-me Curuminha e desabei meu pranto! Chico entende de lágrimas. E de risos! Mas não sou tão nostálgica e adoro o Chico de hoje. Não consigo dissociá-lo do de ontem. E a cada Cd, me esbaldo cantando no palco, no circo, num banco de jardim…debaixo da ponte, cantando!

O filme ainda teve a belíssima Mar e Lua com Monica Salmaso, Estação Derradeira , com Péricles, As Vitrines com Ney, e outra montanhas de obras primas para emocionar os novos e mais velhos cantadores.

Futuros Amantes – é a música que encerra o filme. Os escafandristas que descubram quem foi Chico. E quem fomos todos nós. Homens e Mulheres que amam Chico Buarque!!

Vamos nos mandar daqui
Vamos nos casar na igreja
Vamos pra Bahia, dengo
Vamos ver o sol nascer
Vamos sair na bateria!

Ana Adelaide Peixoto, 09 de janeiro de 2016
 


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