Geral
Carnaval: o velho debate novo
19/02/2007
Foto: autor desconhecido.
Para variar vem da Bahia a maior das reflexões que o carnaval brasileiro produziu em 2007. Os próprios baianos, velhos de guerra, têm consciência plena de que o modelo do trio, cordão de isolamento, camarote privado e predomínio de poucos sobre muitos está esgotado. Tem que encontrar outra forma.
Guardadas as proporções, até porque é um acinte querer misturar no mesmo balaio a produção de Salvador com o de João Pessoa e da Paraíba como um todo mesmo assim acho que precisamos encontrar uma fórmula inteligente capaz de gerar um processo de organização pleno, democrático, participativo e de resultados do tipo bom para todos.
Buda Lira, um dos mais conceituados animadores culturais da aldeia, sabe muito bem que, no caso da Bahia, os blocos particulares de grandes artistas, gerando segregação e exclusão, descaracterizaram a festa popular mais famosa do Brasil.
Vejam o que analisa o professor Climaco Dias, da UFBA: Da segunda metade do século XX para cá, chegaram os trios elétricos que romperam com a festa elitizada dos clubes e mansões. Só que, hoje, o trio elétrico é quem atende à elite.
Diz mais: A música do Caetano Veloso expressou muito bem em sua época: Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu (1969). Com o passar do tempo, esse trio elétrico foi transformado em mercadoria e instrumento de ganho de capital.
Outro dado importantíssimo: Então nasceu a corda para cercá-lo, e surgiram os blocos pagos, e os camarotes. Então, atrás do trio elétrico
só vai quem pode pagar, analisa o professor Clímaco.
Já na bucha, de imediato, o Secretário de Cultura, Márcio Meirelles, que assumiu o cargo no dia 1º de janeiro deste ano acredita que o carnaval realmente chegou ao gargalo, em um estrangulamento em movimento autofágico, e corre o risco de acabar. Tudo está na mão do mercado e empresários e o Estado tem que ter o mínimo de regulação e
organização.
Desde antes da posse que o secretário já vinha conversando com o Ministério da Cultura, com os blocos afros e independentes e com a prefeitura de Salvador sobre a necessidade de rediscutir a forma como o carnaval vinha
sendo realizado nos últimos anos. Mesmo com menos de dois meses de mandato, o governo do estado conseguiu organizar os blocos afros e índios e independentes no sentido de debater a distribuição da verba de apoio da Bahiatursa (órgão que administra verba para o setor turístico baiano).
Um detalhe superior
Antes de entrar no nosso caso em si, impressiona como os baianos têm postura vanguardista. Inventaram o danado do trio, mas com zelo na história e na preservação dela, ao invés de antropofagia reinventam a nova discussão para gerar passos novos de soberania do fazer baiano carnavalesco.
Faz tempo, muitos anos mesmo, que a Bahia se impõe por esse jeito inteligente de saber encarar os desafios com a razão se sobressaindo e nunca a paixão, o revide, a intriga, como é comum em muitas sociedades, inclusive a nossa.
O nosso antigo / novo caso
A versão 2007 do Folia de Rua e do Carnaval Tradição mostrou mais uma vez que continuamos desunidos, semi-profissionais e fortemente dependentes de recursos dos Governos do Estado e Municipal (Prefeitura de João Pessoa).
Há, que ser dito o óbvio: precisamos urgentemente superar a cultura da divisão, da intriga e do despreparo no trato do relacionamento institucional ou seja do jeito que for.
Não dá mais para manter essa divisão, onde o governador Cássio nunca sentou com o prefeito Ricardo Coutinho ( e vice-versa) para afinar uma estratégia comum no trato da questão do carnaval como fomento à cultura e ao negócio, posto que são milhares de micronegócios ajudando muita gente a sobreviver.
Outra história: Folia de Rua e Muriçocas precisam reencontrar o caminho da unidade. Não se trata de interferir nos destinos internos do maior bloco nem o contrário, da mesma forma, mas já é tempo dos seus lideres construírem formas de reforçar o contexto geral e não estimular a divisão na direção do nada.
Além do mais, o contexto geral do Folia de Rua precisa ser repensado: a organização falha requer revisão urgente de processos; o modelo em si está esgotado; o tamanho da folia (blocos) também merece reflexão porque, enquanto por aqui bitolamos a participação, só para se ter uma idéia, em Olinda são mais de 500 blocos cadastrados numa boa só que lá não se espera por governo apenas.
É claro que esta e outras questões não são valores absolutos, nem podem jamais ser impostos, entretanto, quaisquer que sejam os temas estes precisam estar sobre a mesa com debate adulto, civilizado e construtor.
E agora, quem vai se habilitar a deflagrar o processo de agora em diante ou vamos, mais uma vez, jogar sob o tapete a sujeira de nossa incompetência.
Eu, por mim, todos estenderiam as mãos para crescer coletivamente.
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