Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

” Boa noite”


02/07/2014

Foto: autor desconhecido.

Esta canção de Djavan foi lançada em 1992. Na letra ele faz uma declaração de amor para uma recente conquista. Revela-se uma pessoa dominada pelos encantos da beleza feminina que faz desaparecer os ares de autoritaritarismo que predominam no conceito machista.

“Meu ar de dominador dizia que eu ia ser seu dono/e nessa eu dancei!”. A presunção de que ao homem cabe o domínio das situações na relação de um casal, faz com que ele se julgue com direito de posse, de mando e de controle. Ledo engano. O “eu lírico” logo percebeu que estava totalmente errado na expectativa de que a mulher por quem se apaixonara ficaria submissa às suas vontades e aos seus caprichos, como se fosse sua propriedade.

“Nada que brilha cega mais que seu nome/fiquei mudo ao lhe conhecer/o que vi foi demais, vazou/por toda a selva do meu ser, nada ficou intacto”. Começa a demonstrar que sucumbiu diante do fascínio que aquele amor estava lhe causando. A simples pronúncia do nome da amada provoca um brilho tão intenso à visão da sua vida que chega a se sentir cego. Nada mais consegue ver ao seu redor, só ela tem luz para seus olhos. E o seu ser não é mais o mesmo desde que a conheceu, porque ele foi modificado pela força de um sentimento abrasador de paixão.

“Na fronteira de um oásis, meu coração em paz se abalou/é surpresa demais que trazes/inda bem que eu sou Flamengo/mesmo quando ele não vai bem/algo me diz em rubro-negro/que sofrimento leva alem/não existe amor sem medo”. O coração que vivia tranqüilo, de repente se abalou, agitou-se, conheceu as turbulências provocadas pela atração de um amor difícil de conter. A vida passou a ser a cada dia uma caixinha de surpresas, saiu da rotina tediosa, fez experimentar a ansiedade dos próximos acontecimentos nessa relação. Produz sensações de nervosismo iguais a de um torcedor apaixonado pelo seu time. E faz a analogia com a condição de flamenguista. Como se quisesse dizer que já estava acostumado a viver fortes emoções. Afinal de contas quem se dispõe a amar não pode ter medo do amanhã, das conseqüências, dos efeitos que ele pode causar.

“Boa noite!/quem não tem pra quem se dar, o dia é igual à noite/tempo parado no ar, há dias, calor, insônia/oh noite!”. Quando não se tem a quem se doar de corpo e alma num envolvimento sentimental, fica numa sensação de monotonia, nada se apresenta com diferenças, tudo é igual. E essa paralisia no cotidiano, onde nada de novo acontece, ocasiona incômodos que se assemelham ao desconforto do calor e da perda de sono.

“Quem ama vive a sonhar de dia/voar é do homem/vida foi feita para estar em dia, com a fome, com a fome, coma fome”. Ao ser humano é dada a oportunidade de sonhar, fantasiar, ir em busca de sua felicidade. Quem assim não se comporta, não tem amor no coração, é insensível, frio, seco. Precisamos sempre estar vencendo a fome em todos os sentidos. Saciar a fome carnal e espiritual. Nunca deixar de alimentar o corpo e a alma com os desejos inerentes aos prazeres da vida.

“Se vens lá das alturas com agruras ou paz/oh meu bem! Serei seu guia na terra/na guerra ou no sossego quero ser seu cais/e eu sou o homem que pode lhe dar/além de calor, fidelidade/minha vida por inteiro eu lhe dou”. Faz a proclamação de entrega total a esse amor. Como se ela viesse dos céus na figura de um anjo, ele está aqui na vida terrena pronto para compartilhar todos os momentos, sejam tristes ou alegres, sejam de inquietação ou de tranqüilidade. São metades que se completam. Quer que ela saiba que nele encontrará sempre um porto seguro. Será o companheiro de todas as horas, a lhe dar calor e fidelidade.

• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”


O Portal WSCOM não se responsabiliza pelo conteúdo opinativo publicado pelos seus colunistas e blogueiros.
Os comentários a seguir são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.