Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

A rebeldia do parlamento brasileiro


23/06/2015

Foto: autor desconhecido.

 

Era uma quinta feira, dia 12 de dezembro de 1968. O Brasil inteiro aguardava num clima de tensão e ansiedade a votação na Câmara dos Deputados, sobre o pedido para processar e cassar o mandato do deputado carioca Márcio Moreira Alves, que teria feito um discurso concitando a juventude a se abster de participação no desfile do dia Sete de Setembro. Esse pronunciamento foi considerado pelo sistema como ofensivo às Forças Armadas e de caráteR subversivo.

Voltei do almoço para cumprir meu expediente no Banco do Estado da Paraíba, com a preocupação que tomava conta de todos os brasileiros que acompanhavam o desenrolar político daquele episódio. Ao tempo em que torcíamos para que o parlamento não se curvasse à vontade dos ditadores, ficávamos apreensivos pelas conseqüências do que essa atitude pudesse provocar. As informações não chegavam até nós com a velocidade de hoje. Não havia a internet, nem transmissão da sessão da Câmara via satélite pela televisão. Tínhamos que nos valer dos informes colhidos através do rádio. Como estava trabalhando era impossível ficar de ouvido colocado no rádio.

Sentia dificuldade em me concentrar no exercício das atividades que me eram atribuídas como bancário. Meu pensamento estava em Brasília. Pouco mais das três horas da tarde, recebia a notícia que me fez dar um grito de comemoração. O parlamento brasileiro fez opção pela democracia e impôs uma derrota ao governo, num placar de 216 votos contrários à cassação de Marcio Moreira Alves e 141 favoráveis. Foi uma decisão corajosa e histórica. Vários deputados da ARENA se negaram a apoiar a intenção punitiva do governo federal. O resultado foi bastante festejado no plenário e nas galerias, com os vitoriosos cantando o Hino Nacional e gritando “viva a democracia”.

Mas essa alegria durou pouco mais de vinte e quatro horas. Os ditadores reagiram e enfim tiraram a máscara, fazendo com que o país mergulhasse no mais obscuro período da sua história. O Ato Institucional numero 5 dava ao governo poderes de exceção para aplicar punições arbitrariamente contra os que se manifestassem contrários ao regime.

Se a tarde do dia doze foi de festa, a noite do dia treze foi de pavor, medo, incertezas de como seria o “after day”. Vivemos dez anos sob o império do uso abusivo da autoridade, do despotismo, da violência, do cerceamento às liberdades individuais.

• Integra a série de textos “INVENTÁRIO DO TEMPO II”.


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