Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

“A MÃO QUE AFAGA É A MESMA QUE APEDREJA”


26/05/2013

Foto: autor desconhecido.

Muitas vezes frases célebres proferidas por alguém, de tanto serem repetidas, transformam-se em ditados populares. É o caso de um dos versos do nosso conterrâneo Augusto dos Anjos no seu poema “Versos Íntimos”, quando diz; “a mão que afaga é a mesma que apedreja”.

A sabedoria popular se apossou dessa frase e fez dela um axioma, um ensinamento, um chamado à reflexão para as vicissitudes da vida. Ela traduz muito do comportamento humano e permite várias interpretações.

Os que se regem por orientação da doutrina cristã deverão compara-la ao ensinamento bíblico que diz: “oferece a outra face ao que te bate”. É o conceito do perdão.

Outros diriam que reconhecer na mesma pessoa o algoz e o amigo ou companheiro, é uma espécie de doença psicológica, algo como a “síndrome de estocolmo”, onde o seqüestrado termina por se identificar e até mesmo gostar de quem o seqüestrou. Trata-se, na verdade, da predominância do instinto da sobrevivência. A compreensão é de que se aliando ao carrasco reduz sua capacidade ameaçadora e proporciona oportunidades de continuar vivendo.

Por questões de interesses pessoais alguns se dispõem a beijar a mesma mão que o golpeou. Recebe com alegria o afago de quem um dia lhe apedrejou.

Difícil compreender a natureza humana e muito mais ainda julgar o semelhante. Todavia, dificilmente quem um dia maltratou não se sentirá a vontade de repetir a agressão, mesmo tendo recebido o perdão. Porque a personalidade do algoz não muda com eventuais manifestações de perdão de quem dele recebeu o ataque.

Esse fenômeno é muito freqüente na política. Nesse campo de ação o perdão tem outro nome: conveniência. Melhor esquecer mágoas e rancores em nome de projetos políticos, que são muito mais instintos de preservação no poder do que propriamente o sentimento cristão de perdoar o causador de sofrimentos que possa ter vivenciado.

É isso aí. Eu pessoalmente não consigo aceitar que a mesma mão que me afaga seja aquela que me apedrejou um dia. Não guardo rancor, nem nutro sentimentos de vingança, mas nunca beijarei a mão que me jogou pedras e me provocou feridas que não consigo esquecer

* Integra a coletânea de textos que intitulei “REFLETINDO A SABEDORIA POPULAR (ditados e provérbios).
 


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