Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Sociedade

A informação como mercadoria


28/06/2025

A mídia tem o poder de construir realidades — e, quando convém a determinados interesses, também de distorcê-las. Muitas vezes, promove silêncios e esconde verdades, agindo não como instrumento de informação pública, mas como ferramenta de manutenção do poder. No Brasil, a maioria dos grandes veículos de comunicação pertence a famílias tradicionalmente ligadas à política e à economia. Beneficiárias do sistema, essas elites utilizam a mídia como extensão de sua influência.

A atuação da mídia vai além do seu papel primordial — informar com isenção e compromisso ético. O mais preocupante é que, frequentemente, esse compromisso se dissolve diante da busca por lucros ou da conveniência ideológica. A informação é seletiva, filtrada e apresentada sob perspectivas que interessam a determinados grupos. E essa manipulação afeta especialmente as classes sociais mais vulneráveis, onde o acesso à educação crítica é limitado. Para muitos, tudo o que sai na tela ou no papel é a mais pura verdade, tornando-os alvos fáceis de manipulação.

Nesse contexto, impõe-se um questionamento essencial: quais são os limites da atuação da mídia em um Estado democrático? Como evitar que ela transforme a opinião pública em massa de manobra a serviço de interesses escusos? Apesar de sua importância na promoção de mudanças sociais, culturais e políticas, a mídia corre o risco de perder sua função transformadora, tornando-se reprodutora da lógica do capital.

Hoje, ela se posiciona num cruzamento entre interesses econômicos, políticos e corporativos. Isso compromete gravemente sua autonomia e neutralidade. A prática do que se pode chamar de “informação por encomenda” ganha espaço, fazendo do jornalismo uma indústria — e do jornalista, um operário da manipulação. O francês Serge Halimi resumiu com precisão: “A informação é hoje um produto como qualquer outro, objeto de compra e venda, proveitoso ou dispendioso, condenado assim que deixa de ser rentável.”

Ao ser tratada como mercadoria, a informação se submete às leis do mercado, em detrimento de valores éticos e cívicos. O jornalista, nesse cenário, deixa de ser mediador da realidade para tornar-se gestor da opinião pública. E a notícia, que deveria ser um retrato fiel do que as fontes dizem, passa a ser contaminada por pressões externas, por disputas de audiência, por compromissos comerciais e por interferências políticas.

Falar do jornalismo como o “quarto poder” pode soar ilusório. Na prática, esse poder está subordinado aos centros de decisão econômica, política e tecnológica. Muitos jornalistas, mesmo conscientes do papel que deveriam desempenhar numa democracia, atuam hoje como ressonância dos outros poderes, não como seu contraponto.

A crise do jornalismo contemporâneo não é apenas de credibilidade — é de identidade. Quando a informação vira produto, a verdade vira moeda. E o interesse público, que deveria ser o norte da comunicação social, cede lugar ao interesse privado, aos lucros e à influência.

Mais do que nunca, é preciso reivindicar uma mídia comprometida com a verdade, com a ética e com a cidadania. A sociedade não pode abrir mão de um jornalismo que seja, de fato, um espaço de reflexão crítica e vigilância democrática.

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