Política
A democracia requer democratas
26/12/2023
Descrições coloridas por preferências políticas ou classes sociais demonstram a dificuldade de definir precisamente o significado e a função da sociedade civil na democracia moderna. Sabemos que ela é composta por famílias, vizinhos, grupos comunitários, organizações sem fins lucrativos e redes sociais de diversas variedades, conforme observado por Alexis de Tocqueville. Comentários sobre a importância do voluntariado na democracia nos levaram a explorar de perto e nos tornar protagonistas dos movimentos sociais nos anos 60 na América.
Carregamos conosco lições adquiridas durante nossa juventude em João Pessoa, quando partimos em 1964. Aprendemos o respeito pela dignidade e pelos direitos alheios, a convivência democrática e o comprometimento social. Valores promovidos e praticados por “Seu” Odilon no Círculo Operário de Jaguaribe e nos Escoteiros do Tenente Lucena nos prepararam para adentrar no mundo de Alexis de Tocqueville, tão estrangeiro quanto fascinante. A sociedade civil é a chave-mestra para uma sociedade possível e para uma democracia duradoura.
Caracterizar a sociedade civil como algo pertencente à esfera econômica ou política é incorreto e pouco democrático. Ela pertence à esfera social, onde indivíduos se unem para criar relacionamentos horizontais, fortalecidos pela confiança e motivados pela colaboração cidadã.
O progresso social, muitas vezes, ocorre à revelia da sociedade civil, especialmente quando o crescimento e fortalecimento de associações cívicas são prejudicados pela diminuição do engajamento voluntário e pela crescente dependência de recursos e autoridade do Estado. A atrofia da sociedade civil coloca o indivíduo em uma vivência conflituosa e politizada, onde todos os caminhos levam a advogados, tribunais ou programas assistencialistas. Somos constantemente convocados a exercer funções tutelares sobre pessoas vulneráveis e famílias disfuncionais.
Ao retornarmos em 2004, nos perguntamos: se estamos tão bem, por que nos sentimos tão preocupados? Muitos brasileiros gostariam de ter uma resposta.
A prosperidade e as dificuldades em enfrentar os problemas de nossa sociedade estão em colisão. Diariamente, somos servidos com reportagens sobre crimes, drogas, corrupção, fragmentação da família e outros males sociais, ao lado de notícias sobre a retomada do desenvolvimento da economia brasileira. Optamos pelo caminho mais fácil e, gradualmente, nos tornamos uma nação de espectadores, tomando decisões governadas por preferências e possibilidades de ganho pessoal, esquecendo o bem coletivo.
Enquanto a influência de nossas instituições sociais diminui, o Estado centraliza cada vez mais suas relações com o povo. As possibilidades e benefícios de uma sociedade civil vibrante e democrática são obscurecidos pelo clientelismo, dependência e manipulações político-partidárias, ameaçando sua sustentabilidade e retardando o desenvolvimento humano em uma atmosfera de progresso cívico e social.
Devemos sempre lembrar que a democracia é frágil. Ela precisa ser nutrida e protegida. Como disse Benjamin Franklin na Convenção Constitucional dos Estados Unidos da América, “temos uma república, se pudermos mantê-la”. Preservar uma democracia vai além da realização de eleições, legislação ou administração da máquina estatal. Requer um número incontável de cidadãos unidos pelo bem comum e pela capacidade de autogoverno. A democracia requer democratas.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores
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