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Casemiro revela “convite” para defender a Espanha

TITULAR DO REAL


02/04/2017



 Em pouco mais de quatro anos, Casemiro passou por uma evolução que poucos imaginavam ser possível. Foi de contestado no São Paulo a absoluto no Real Madrid e na seleção brasileira. O "Casemarra", como alguns o chamavam no Brasil – marra confundida com timidez, segundo ele -, virou "Casemito" na Europa, com elogios constantes de Tite, Zidane, torcida e imprensa. Mas como essa transformação foi possível? Foi o que o próprio volante tentou explicar nesta entrevista exclusiva ao Esporte Espetacular e ao GloboEsporte.com. 

 O grande momento vivido por Casemiro lhe rendeu até um "convite" para defender a seleção espanhola. Em tom de brincadeira, ele partiu do atual técnico da Roja, Julen Lopetegui, que o havia comandado no Porto – o brasileiro se destacou durante o empréstimo ao time português, antes de voltar ao Real Madrid.

 – Numa das conversas que tivemos depois que voltei para o Real Madrid, ele (Lopetegui) brincou: "Não quer virar espanhol?". Mas sou brasileiro com muito orgulho – contou.

 Aos 25 anos, Casemiro se mostra muito mais maduro do que nos tempos de São Paulo, de onde saiu com quase 21. Ele acredita que todo bom time precisa de um carregador de piano, mas não se limita a isso – Zidane o incentiva a sair para o jogo, passar a bola e chutar a gol. E admite que o técnico francês o vê um pouco como Makélélé, que fazia o "trabalho sujo" para que o próprio Zizou, Figo e Beckham brilhassem no meio-campo dos antigos galáticos do Real. Ele falou ainda sobre o abondono do pai e o fato de ser o homem da família desde os 15 anos, o sonho de jogar a Copa do Mundo, e se revelou um estudioso de estatísticas e do futebol em geral.

 A seguir, confira a entrevista completa com Casemiro:

 RAZÕES DO SUCESSO

 A força de vontade, a humildade, e o principal é o trabalho. O trabalho no dia a dia conta muito. Tento levar isso para dentro de campo.

 CHAMADO DE CASEMITO, VITAMINA C, PEÇA-CHAVE…

 Fico feliz, mas tento não me iludir com essas coisas, pois sabemos que no futebol o mundo dá muitas voltas. Dois jogos podem mudar tudo. Tento manter meu pensamento e meu trabalho de querer fazer sempre meu melhor. Tento fazer o meu melhor, ajudar os companheiros e, claro, o Real Madrid.

 ZIDANE TE VÊ COMO MAKÉLÉLÉ?

 Pode ser um pouco. Até porque temos do lado o Luka Modric e o Toni Kroos, que têm quase a mesma qualidade (que Zidane). O Zidane para mim é um ídolo. Eu cresci o vendo jogar. Ele sempre pede para eu sair com a bola e jogar, não ficar só na marcação.
 

 RELAÇÃO COM ZIDANE

 No começo foi um pouco difícil. Eu cresci vendo ele jogar. E é o Zidane! Foi um pouco difícil. Agora tem um respeito como treinador. Tem que respeitar o Zidane, ele tem sua história no futebol.

LIGADO EM ESTATÍSTICA

 Sou muito ligado. Gosto de ver depois dos jogos, principalmente os meus erros, gosto de acompanhar. Sempre gostei de analisar. Antes do jogo pergunto para o mister o que ele acha disso e daquilo, no que ele quer que eu melhore, o que ele acha do time adversário. Gosto de aprender no dia a dia.
Gosto de ver primeiro os passes errados, posicionamento de jogo. Se no jogo eu erro mais do que quatro passes, no dia seguinte o mister já está… "Perdeu muita bola, tem que melhorar". A margem de erro tem que ser a mínima possível, por isso ele cobra bastante. E eu gosto de aprender também.

 CARREGADOR DE PIANO

 Em um time você tem que ter vários jogadores: o estrela, o que define, o que carrega piano, que briga até o final… Em um elenco tem que ter vários jogadores, pois assim que se ganha títulos. Tento ajudar meus companheiros e fazer meu melhor sempre.

 

 FAMA DE MARRENTO NO PASSADO. OU É TIMIDEZ?

 Cada um tem sua opinião. Claro que você sofre com isso. Você não tinha nada na infância e, quando consegue alguma coisa, falam que é arrogante. Fico triste com isso. Mas sou muito tímido, não gosto de falar. Fico nervoso, estou nervoso agora nesta entrevista (risos). Não gosto de falar muito, tenho muita vergonha. Na minha infância sofri muito com essa timidez. Não gosto de aparecer muito, prefiro ficar na minha.

 PERDA DE FOCO NO SÃO PAULO?

 Hoje, como homem e com a mentalidade que tenho, teria feito coisas diferentes. Mas não diria que me arrependo. Falavam muitas coisas. Nunca fui afastado por mal comportamento. O clube nunca me puniu por algo. Muitas coisas não eram verdade. Tenho 24 anos, moro há quatro na Europa e estou mais experiente. Mas não diria que estava tudo errado com o Casemiro, pois nunca tive problema com o clube. Até hoje tenho carinho imenso pelo São Paulo, tenho grandes amigos lá.

 NÃO FEZ A HISTÓRIA QUE QUERIA NO SÃO PAULO

 A equipe oscilava muito, e eu oscilava junto. Até hoje isso acontece muito com o São Paulo. A minha trajetória lá foi de acordo com o clube. Mas claro que eu queria ter feito muito mais, ter ganhado mais títulos, pois foram 11 anos de São Paulo. Foi o clube que me proporcionou muita coisa no futebol, ajudou minha família e a tirou da periferia de São José dos Campos. Sempre vou ter um carinho imenso pelo São Paulo.

 FALTA DE UM PAI

 Nunca tive um pai, e a dificuldade sempre foi essa. Tenho mais dois irmãos. Minha mãe era diarista, estava sempre trabalhando e não tinha condição de me levar para o treino. Eu sempre ia sozinho. Ela não podia, tinha que trabalhar, colocar comida dentro de casa. Eu tinha o sonho de ser jogador, mas minha mãe infelizmente não tinha estrutura para me ajudar. Mas tenho que agradecer à minha família, principalmente à minha mãe.

Ela sempre brinca que desde os 15 anos anos eu sou o pai da família. Até mesmo hoje. Eles moram no Brasil, eu que cuido deles e os ajudo. No Dia dos Pais os meus irmãos me dão carta de "Obrigado, papai". Isso é muito legal, fico muito feliz. Desde jovem eu já cuidava da minha família como pai mesmo.
 

POSSÍVEL REENCONTRO COM O PAI

 Hoje não tenho problema nenhum em falar, mas não penso muito nele. É a vida. Ele quis assim, não tem problema algum. As coisas aconteceram bem. Que bom para ele, e para a minha família. Sou grato à minha mãe. Tenho um carinho imenso por ela.
Minha mãe fala que ele é que nem eu, tímido, e que, mesmo querendo, ele não me procuraria hoje. Acho que não tem mais clima, mais assunto. Se ele me procurar, claro que vou recebê-lo com o maior carinho. Mas já passou.

 POUCO ESPAÇO COM ANCELOTTI NO COMEÇO PELO REAL

 Não tive muitas oportunidades com ele, mas naquele momento tinha o Xabi Alonso, Di María, Luka (Modric). Não tive muita chance, mas tive um aprendizado com ele. Aprendi muitas coisas. É outro treinador que está no topo.

 SUCESSO NO PORTO

 O Porto é um clube que, quando você sai dele, continua torcendo. A cidade, o pessoal que trabalha lá vive o clube. Tenho um carinho imenso pelo Porto por isso. Fiquei um ano lá e tenho contato até hoje. O clube dá uma assistência fora de campo extraordinária, te proporciona muitas coisas. Quando fui para lá, aprendi muito com o Lopetegui, que agora está na seleção da Espanha. Ele é chato com tática, está sempre cobrando, então foi um aprendizado excelente para mim.

 "CONVITE" PARA DEFENDER A ESPANHA

 Numa das conversas que tivemos depois que voltei para o Real Madrid, ele (Julen Lopetegui, ex-técnico do Porto e atual da seleção espanhola) brincou: "Não quer virar espanhol?". Mas sou brasileiro com muito orgulho.
 

 ENCAIXE PERFEITO NA SELEÇÃO

 O Tite tenta tirar o melhor que você faz no clube, não tenta mudar muito a posição. Ele pediu para eu fazer o que faço no Real Madrid. Claro que com ajustes dele, normal. Mas esse é um dos méritos dele, colocar na Seleção o que você faz no clube. Com todos os jogadores da Seleção é mais ou menos isso.

 JOGAR UMA COPA DO MUNDO

 É um sonho. Tem a ansiedade, mas gosto de vivenciar o dia. Temos que fazer uma boa trajetória e chegar bem no Mundial. Com muita humildade, se Deus quiser vamos chegar bem no Mundial e conseguir o que todos nós queremos, que é sermos campeões do mundo. E a Seleção voltou a jogar bem, isso é o mais importante para nós.

 APRENDENDO A FALAR INGLÊS

 Inglês hoje é muito importante. Não só para falar com os árbitros, mas na vida. É bom ter um diálogo melhor com os árbitros, com as pessoas no clube, pois tem jogadores aqui que falam inglês. É importante na vida.

 GOLAÇO CONTRA O NAPOLI

 Não é muito normal eu fazer gol, ainda mais como aquele. Quando a bola veio, falei: "Vou arrebentar a bola. Ou tiro do estádio ou faço um golaço". Ela não estava fácil. Mas quando eu bati na gola, já pensei que seria golaço, pois saiu perfeita. Graças a Deus foi um golaço. Não é normal, mas é coisa que treino. O mister me pede muitas coisas, e uma delas é chutar a gol, porque estamos de frente e sempre tem oportunidade.
Assista ao golaço de Casemiro contra o Napoli, pelas oitavas de final da Champions

 AMIZADES NO REAL MADRID

 O Marcelo… Esse cara é o melhor, sensacional. Tenho muito prazer de trabalhar do lado dele. É um cara por tenho um carinho grande. Do jogador Marcelona a gente não precisa falar nada, senão ficaria o dia inteiro. A alegria que ele transmite dentro de campo é a mesma fora. Ele é um dos mais parceiros, junto do Danilo. Os portugueses também, o Cris, Pepe, Coentrão. Tem o Karim, o Luka Modric também. Todos.

 COMPARAÇÃO REAL E SÃO PAULO

 Aqui é Champions League. Gosto de falar que aqui é que nem no São Paulo. No São Paulo é Libertadores, o clube se transforma. Claro que todos os títulos são importantes, queremos ganhar todos. Mas na Champions o clube se transforma. O clube vive a Champions, não à toa tem 11 títulos.

 ESTUDIOSO DO FUTEBOL

 Jogar futebol não é só dentro do campo hoje em dia. Não é só tocar e roubar a bola dentro das quatro linhas. É saber o que você está fazendo. Tem que saber a história do clube, a história do futebol. Ainda mais eu. Minha mulher até reclama, fala que eu vejo até campeonato belga. Eu gosto de estudar, de vivenciar. Futebol é isso.

 DIFERENÇAS PARA O CASEMIRO DO SÃO PAULO

 É difícil falar, pois já se foram quatro anos. Jogador que começa com 18 anos, 19, 20, e agora tem 25… São diferentes. Você aprende muitas coisas. O jogador pode ter 38 anos que vai continuar aprendendo. A mentalidade hoje é diferente, com mais bagagem e experiência. Isso é a vida. Me sinto muito mais experiente hoje do que nos tempos de São Paulo.


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