Futebol

Brasileiro que jogou na Síria fala dos horrores da guerra: ‘Não volto para lá’

Síria


03/09/2013

O atacante brasileiro Edmar Figueira, de 29 anos, viu de perto o caos que assola a Síria, país do Oriente Médio mergulhado em uma guerra civil desde março de 2011 e que já deixou 110 mil mortos. De janeiro a julho deste ano, o jogador defendeu o Al-Shorta, atual campeão nacional. Ele conta que viveu dias de apreensão na capital Damasco, e que recusou proposta para continuar jogando no segundo semestre por causa da escalada de violência. A tensão na região cresceu nos últimos dias devido à perspectiva de um ataque norte-americano à Síria, em represália ao suposto uso de armas químicas pelo regime sírio na guerra civil.

Edmar estava no Oberneuland, time da terceira divisão alemã, quando recebeu convite do volante brasileiro Gilson Tussi para atuar na Síria. Para tranquilizar o amigo, Tussi procurou minimizar as notícias sobre o conflito armado. Mas logo na chegada a Damasco, os horrores da guerra estavam evidentes.

– Quando cheguei, a cada 5 minutos ouvia bombas explodindo ao redor da cidade, uma loucura. Eu morava em um hotel no centro de Damasco, e perto dali houve um atentado com mais de 100 mortos. Durante o período que estive lá a cidade permaneceu com várias áreas interditadas, tinha muitas barreiras para revistar os carros, era perigoso andar pelas ruas – conta o jogador.

O atacante partiu para o Oriente Médio confiante de que faria boas atuações pelo Al-Shorta. A equipe lutava por uma vaga na fase final da Copa dos Campeões da Ásia. Mas a guerra civil acabou prejudicando em parte os planos da equipe, que era dependente de financiamento do governo central e deixou de lado a contratação de atletas estrangeiros. Os dois brasileiros acabaram sendo os únicos estrangeiros do Al-Shorta, e provavelmente de toda a liga síria.

A guerra civil produziu efeitos nefastos também no futebol. Em fevereiro, duas bombas caíram próximas ao estádio Tishreen, em Damasco, e causaram a morte do atacante Youssef Suleiman, do Al-Wathbah, durante os treinamentos. No dia seguinte, era a vez do brasileiro Edmar treinar com o grupo do Al-Shorta no local.

– Nos contaram que os jogadores estavam no vestiário na hora da explosão e que um vidro caiu sobre o jogador, causando a morte dele. Tínhamos de ir ao estádio para treinar no dia seguinte e ficamos bastante apreensivos, mas graças a Deus não aconteceu nada com a gente – relata Edmar.

Apesar das dificuldades, Edmar avalia que o nível do futebol sírio é bom e que as equipes locais são fortes, equiparando-se a times de países asiáticos com maior tradição, como Tailândia, Índia, Indonésia e Qatar. O atacante, natural da cidade sul-mato-grossense de Naviraí, já teve passagens por clubes brasileiros, europeus, asiáticos e da América Central. Sua atuação mais destacada foi pelo Pune, da Índia, em duas temporadas, onde conquistou a Bola de Ouro em 2010. De lá ele regressou à Europa, passando por Portugal e Romênia até desembarcar na Alemanha – última estadia antes do Oriente Médio.

As andanças de Edmar pelos quatro cantos do mundo podem virar um livro. O jogador pretende finalizar a obra intitulada “Andarilhos da Bola”, para contar suas experiências, histórias engraçadas, conflitos étnicos e a dificuldade experimentada nos países por onde atuou. O atacante está de malas prontas para regressar ao futebol indiano, e aguarda no Brasil a formalização do contrato e a liberação do visto.

Na Copa dos Campeões da Ásia, o Al-Shorta conseguiu a classificação para as quartas de final e vai enfrentar o Al-Qadisiya, do Kuwait, nos dias 17 e 24 de setembro. Gilson Tussi permaneceu no elenco. Edmar preferiu não renovar o contrato, temendo o conflito armado e também preocupado com a continuidade do campeonato local.

– Na situação em que está o país, eu não volto para lá – completa.



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