Automobilismo

Assessora conta como domou Senna: “Ele demorou mais de ano para entender”

Lembrança


01/12/2013

 Ayrton Senna foi o primeiro piloto da Fórmula 1 a contar com um assessor de imprensa exclusivo. E no mundo machista do automobilismo, ele escolheu uma mulher para a função. Betise Assumpção ficou ao lado de Senna de 1990 até acidente fatal em Imola, em 1994, e aprendeu a domar o tricampeão mundial. “Demorou um ano e meio ou dois para ele entender que eu não queria só puxar o saco e que estava lá para fazer o que estavam me pagando, que era fazer com que ele tivesse uma relação melhor com a imprensa”, afirma Betise.

A jornalista elogia a postura de Senna, mas lembra que teve trabalho problemas no começo. “Ele era muito tranquilo e educado. Ele tinha bom senso e sabia escutar. Nunca tivemos um arranca-rabo, mas imagino que mais por ele do que por mim”, resume Betise. “Mas o relacionamento dele com a imprensa era péssimo. Ele tinha brigado com todo mundo e a imprensa o via como um mimado, um terceiro mundista e que achava que podia fazer o que queria”, lembra a jornalista.

O trabalho, que também era novo para Betise, já que era a primeira vez que ela atuava como assessora de imprensa e não apenas como jornalista. E a maior dificuldade foi fazer Senna entender a imprensa e aprender a lidar com todos os jornalistas. “A primeira vez que ele veio reclamar sobre a imprensa, que não tinha paciência e que não iria falar com jornalista, eu respondi: ‘Você quer que eu fale o que quer ouvir ou o que me paga para ouvir?’. Ele me olhou com uma cara… Ele era rodeado de gente que só falava sim, como acontece até hoje com esses caras famosos, mas eu falava a realidade e mostrava uma saída, uma solução”, conta.

Ela conheceu Senna quando trabalhava para revistas aqui no Brasil. Em 1986, ele foi eleito o esportista do ano pela revista Placar, da editora Abril, e Betise foi quem fez o especial sobre o piloto. Um ano depois ela foi para a Londres para estudar inglês e buscar novas oportunidades como jornalista. Lá, reencontrou o piloto.

“Fui ao torneio de Wimbledon e o encontrei totalmente sem querer. Ele era muito amigo de um colega da minha irmã. Era um sábado e ele perguntou se eu não queria jantar com ele no dia seguinte. Era uma despedida para o pessoal da Honda. Depois do jantar, ele até acabou nos dando carona para casa e eu contei os planos que tinha, de trabalhar na Inglaterra. Em 89, o pai dele me ligou e me ofereceu o emprego para trabalhar com ele”, diz a jornalista.

“No dia da corrida ele só deu um bom dia e não falou com ninguém. Entrei no motor home e perguntei se poderia fazer alguma coisa, mas ele disse que não. Eu estava sentada meio perto e fiz um carinho no cabelo dele. Nunca tinha feito isso na vida. Ele estava péssimo e só levantou a cabeça, me olhou no olho e disse obrigado. Eu saí”, detalha.

Betise ainda fala que os pilotos já se incomodavam com o circuito de Imola e pensavam em lutar por reformas. “Não pensou que fosse morrer ou nada assim. Bobagem. Acho que ele devia estar pensando que poderia ter feito alguma coisa (com relação a mudanças na pista). Ele era assim, se sentia responsável e se via alguma coisa, achava que era ele quem poderia arrumar”, comenta.

Ela ficou com a família Senna até setembro daquele ano. “Eu fiquei um ano meio anestesiada. Fazia ginástica cinco vezes por semana e isso me ajudou a não cair em depressão. Tinha perdido tudo. Não era só um emprego, era o status. Antes eu era a assessora do Ayrton Senna, depois era uma frella fazendo materinhas. Ainda bem que era responsável e tinha dinheiro no banco”, afirma.

A jornalista ainda seguiu ligada à Fórmula 1. Em agosto de 1994 começou a namorar Patrick Head, co-fundador da Williams. Eles se casaram três anos depois, ficaram juntos até 2009 e têm dois filhos: Luke, de 15 anos, e Julia, de 12. Betise deixou a assessoria de pilotos, mas segue morando em Londres e ainda é ligada ao mundo dos esporte. Ela montou a sua empresa em 2011, trabalhou nos Jogos Olímpicos de 2012 e, agora, quer atuar no Rio 2016, trabalhando a imagem do Brasil e dos Jogos no exterior.



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