Saúde

Aprenda a tirar o máximo proveito da soneca diurna

Sono


28/01/2015

 Estudos indicam que dormir durante o dia pode trazer benefícios cognitivos para uma pessoa, entre eles, melhorias na capacidade motora, no estado geral de atenção, na percepção e no processo de consolidação da memória.

No entanto, as pesquisas também sugerem que, para que tiremos máximo proveito de um sono rápido no meio da tarde, é preciso que respeitemos algumas regras. O horário e a duração da soneca, por exemplo, são cruciais. Na matéria a seguir, a BBC faz um apanhado com alguns desses estudos e experiências feitas por empresas que incorporaram cochilos ao dia de trabalho dos funcionários.

Uma pesquisa publicada em 2013 concluiu que tanto o sono noturno como o diurno melhoraram a capacidade dos participantes de memorizar pares de palavras sem relação umas com as outras – por exemplo, "pimenta" e "cotovelo". Isso indica que, se você está tentando aprender conceitos complexos, o sono pode ajudá-lo.

Outra investigação, feita na Universidade de Tecnologia de Pequim, na China, avaliou os efeitos da soneca sobre atletas após treinamentos. Os especialistas chineses concluíram que o cochilo melhorou a função cerebral e os sistemas visuais dos atletas, além de promover sua recuperação física e mental. Esse estudo corrobora resultados de pesquisas anteriores, que demonstraram que a soneca pode facilitar a consolidação de memória motora.

Em um estudo publicado em 2008, uma pesquisadora da University of California, nos Estados Unidos, comparou os benefícios de 200 mg de cafeína (o equivalente a uma xícara de café) aos de uma soneca com duração entre 60 e 90 minutos. Sara Mednick, autora do livro Take a Nap! Change Your Life (em tradução livre, Mude Sua Vida: Tire uma Soneca), concluíu que, de maneira geral, a soneca melhorou a memória dos participantes, enquanto a cafeína ou não teve qualquer efeito, ou piorou seu desempenho.

Mednick e sua equipe têm uma possível explicação para esse efeito da cafeína: eles dizem que talvez ela bloqueie a consolidação de novo material em memória de longo prazo ao aumentar níveis de um neurotransmissor chamado acetilcolina no hipocampo cerebral. Índices desse neurotransmissor no cérebro diminuem naturalmente durante o chamado sono de ondas lentas (o termo se refere a uma fase do sono em que o cérebro é varrido por ondas elétricas sincronizadas de alta amplitude e baixa freqüência).

Cochilo no Escritório

Tantas promessas de benefícios convenceram alguns empresários a colocar a teoria em prática. No início do ano passado, o fabricante de softwares HubSpot criou uma "sala da soneca" em seu escritório em Massachusetts. O espaço possui uma rede e iluminação suave, e fica à disposição dos funcionários.

Segundo a assessora de comunicação da companhia, Alison Elworthy, a nova política está fazendo sucesso, especialmente entre funcionários que acabam de ter filhos e precisam se recuperar das noites passadas em claro. Funcionários que estão retornando de viagens transatlânticas, sofrendo com diferenças de fuso horário, também estão fazendo uso da sala.

"O pessoal fica realmente entusiasmado com a novidade e não houve abusos de maneira alguma", disse.

Em outras empresas, a política, aparentemente, não deu tão certo. No início do ano passado, algumas companhias relataram que políticas para incorporar sonecas ao dia de trabalho haviam resultado em lentidão e protelações. Uma start-up com sede em Toronto relatou uma queda de produtividade de 30% como resultado de políticas desse tipo.
Ainda assim, Mednick diz que cerca de 40% da população já têm o hábito de tirar sonecas durante o dia. Segundo ela, essas pessoas sentem necessidade e se beneficiam de cochilos regulares durante a tarde.

Arte do Cochilo

De acordo com os pesquisadores, o horário mais natural para o cochilo – baseado nos nossos ritmos circadianos (o relógio biológico do homem) – é o período entre 2 e 4h da tarde.

Fases do Sono

Quando uma pessoa dorme, observam-se em seu cérebro alterações fisiológicas que se repetem em ciclos
Durante uma noite de sono, ocorrem cinco ciclos, cada um com duração entre 90 e 120 minutos
A primeira fase de cada ciclo é conhecida como sono Não REM e pode ser dividida em três estágios:
Estágio 1 – sonolência, transição entre vigília e sono
Estágio 2 – a pessoa começa a dormir e ocorrem várias alterações eletroencefalográficas, entre elas, o Complexo K e Fusos
Estágio 3 ou estágio 3/4 – sono profundo, também chamado de Sono de Ondas Lentas. Nesse estágio, o cérebro é varrido por ondas elétricas sincronizadas de alta amplitude e baixa freqüência
A segunda fase é conhecida como sono REM, caracterizada por movimentos oculares rápidos (em inglês, rapid eye movements)
Os ciclos se repetem aproximadamente a cada 90 minutos, do Não REM ao REM

O sono tem papel regulador do metabolismo, reforça a imunidade e pode até trazer melhorias no humor
Mednick desenhou um gráfico que aponta os horários ideais para uma soneca – horários em que o cochilo incluiria doses equilibradas de sono de ondas lentas e também de um outro tipo de sono caracterizado pela presença de movimentos oculares rápidos, ou sono REM (sigla para Rapid Eye Movement). Esse ponto de equilíbrio tende a ocorrer entre seis e oito horas após a pessoa acordar.

Em um estudo feito em 2009, Mednick e seus colegas compararam os efeitos do sono REM, do sono sem REM e de um descanso silencioso (sem dormir) sobre a capacidade de um grupo de estudantes de resolver problemas usando a criatividade.

Na manhã do teste, os participantes do experimento fizeram um exercício onde tinham de encontrar uma palavra que, de alguma forma, se relacionasse a três outras palavras aparentemente sem qualquer relação entre si. Por exemplo, "caindo", "poeira" e "ator" podem ser associadas à palavra "estrela". No início da tarde, alguns estudantes tiraram cochilos com REM, outros tiraram cochilos sem REM e o terceiro grupo descansou mas não dormiu.

Quando retornaram no final da tarde para fazer novas versões do exercício feito pela manhã, os estudantes que haviam tirado cochilos com REM tiveram o melhor desempenho. Ou seja, aparentemente, o sono REM pode melhorar o processo de resolução criativa de problemas.

"Se você está querendo um sono restaurador, deve dormir mais para o final da tarde, quando seu sono terá mais ondas lentas", diz Mednick. "E se você está querendo um sono que ajude sua criatividade, você deve dormir mais cedo (no início da tarde), quando seu sono terá mais REM".

Mas para obter sono com REM, é preciso dormir por mais tempo – entre 60 e 90 minutos – porque esse é o último estágio do ciclo de sono.

Sonecas curtas, por outro lado, também trazem benefícios.

Um estudo feito na Austrália revelou que uma soneca de dez minutos durante a tarde foi suficiente para ajudar os participantes a se recuperarem de uma noite mal dormida. Eles disseram estar se sentindo menos sonolentos e mais energizados. E apresentaram melhorias em seu desempenho cognitivo durante até 155 minutos após a soneca.
Embora cochilos de 20 e 30 minutos também tenham apresentado benefícios, as melhorias cognitivas levaram mais tempo para se manifestar. Presume-se que isso tenha acontecido porque os participantes tiveram de se recuperar da inércia provocada pelo sono mais prolongado.

Esses resultados confirmam uma pesquisa feita por John Groeger, professor de psicologia da University of Hull, no Reino Unido. De acordo com a pesquisa, quem tira soneca deve evitar tarefas complicadas, de grande importância, logo após acordar. "Quando você acorda, pode fazer tarefas simples", disse. "Mas seu cérebro precisa de uma hora ou duas para voltar a funcionar plenamente".

Na Hora Certa

Portanto, acertar o horário da soneca é essencial. Isso é algo que os novos aplicativos em smartphones e até as chamadas "máscaras de sono" tentam calcular para você.

A NeuroOn, uma máscara de dormir inteligente que monitora ondas cerebrais e movimentos oculares do usuário para acordá-lo no momento certo, deve chegar às lojas ainda neste ano. Um aparelho semelhante chamado Zeo chegou a ser vendido nos Estados Unidos no ano retrasado, mas a empresa fechou as portas.

Em um estudo recente, Nicola Cellini, pesquisador da Universidade de Pádova, na Itália, comparou o aparelho Zeo aos instrumentos usados para monitorar o sono em laboratórios e concluiu que ele não funcionava tão bem como os equipamentos usados pelos cientistas. Cellini especula, no entanto, que seja apenas uma questão de tempo até que um aparelho desse tipo, capaz de monitorar com precisão as diversas fases do sono de uma pessoa, chegue ao mercado.

Reservas

É possível, no entanto, que o cochilo no meio da tarde não traga benefícios para todo mundo.

A pesquisadora Elizabeth McDevitt do Sleep and Cognition Lab da University of California, Riverside, está investigando se pessoas que não têm inclinação natural para tirar sonecas diurnas obtêm benefícios cognitivos ao ser treinadas para dormir regularmente durante o dia. O estudo ainda não foi publicado, mas segundo McDevitt, os resultados preliminares parecem sugerir que não. Ou seja, se você não sente necessidade de uma soneca, não adianta se forçar.

Cellini e outros especialistas também rejeitam a teoria do "sono polifásico" – uma estratégia na qual as pessoas dormem durante períodos curtos ao longo do dia de forma a passar menos tempo dormindo.

"Não importa como você organiza as sonecas, elas jamais vão ser tão benéficas quanto uma boa noite de sono", ele diz.

A psicofarmacóloga Sabine Pompeia, que fez pesquisas no Grupo de Sono da Universidade Federal de Sâo Paulo (Unifesp) e é professora do Departamento de Psicobiologia da mesma universidade, também é dessa opinião. "O ideal, para a maioria das pessoas, é dormir à noite. Se você não pode, tire uma soneca".

"O sono tem função reguladora do metabolismo, reforça a imunidade e até melhora seu humor", diz Pompeia.
 



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