Paraíba

Andréa Bezerra avalia impactos ambientais de Estaleiro de Lucena

EM LUCENA


26/11/2016

A colunista de meio ambiente do Portal WSCOM, Andrea Bezerra, analisou, em nova coluna, os impactos ambientais com a implantação do Estaleiro de Lucena e a privatização do estuário do Rio Paraíba.

Segundo Andrea, a construção do estaleiro ocasionará o “desmatamento de 14 hectares de mangue, dragagem e aprofundamento do rio para passagem de navios, impactos diversos na qualidade da água, mudança nas correntes, nas rotas dos organismos, queda da diversidade e perda do território de pesca, temporária ou permanentemente”.

No estuário, local de transição das espécies do continente para o oceano, vivem espécies nativas que serão diretamente afetadas – algumas com risco de extinção, a exemplo dos peixes-boi.

Confira a coluna na íntegra:

{arquivo}O Estaleiro de Lucena e a privatização do Estuário

Este mês comemoramos o dia da Independência do Brasil e pouca coisa mudou de lá pra cá, na forma como tratamos nossas maiores riquezas. Como colônia de exploração, fomos saqueados desde a invasão dos europeus e seguimos com a privatização dos recursos naturais nos dias de hoje.

O Estuário do Rio Paraíba, que interliga os municípios de Lucena, Santa Rita e Cabedelo, passa atualmente por um processo de licenciamento para implantação de um Estaleiro de reparação de navios.

Ao todo serão privatizados cerca de 40 hectares de estuário e mangue, o equivalente a 40 campos de futebol de Área de Preservação Permanente e Patrimônio Público cedidos para uma empresa norte-americana, caso a construção seja autorizada. A construção prevê o desmatamento de 14 hectares de mangue, dragagem e aprofundamento do rio para passagem de navios, impactos diversos na qualidade da água, mudança nas correntes, nas rotas dos organismos, queda da diversidade e perda do território de pesca, temporária ou permanentemente.

Os estuários são áreas de transição entre o continente e o oceano, possuem adaptações à água salobra, abrigam espécies nativas, endêmicas e ameaçadas de extinção, como os caranguejos, tartarugas, peixes-boi, tubarões e uma vasta lista de espécies. A complexa rede biológica estuarina apresenta alta produtividade, recicla a carga de nutrientes que recebe dos rios, protegendo a costa de poluição, enchentes e erosões, dentre diversos serviços ambientais.

O mangue é protegido por leis ambientais, como o Código Florestal, da Mata Atlântica, e de proteção da fauna silvestre. Há uma tendência mundial de tornar os estuários, Unidades de Conservação, legalmente mais protegidos pela importância ecológica, a exemplo da APA de Mamanguape, a jusante do Rio Paraíba.

O desmate do mangue é permitido em caso de interesse público, e ponderar o que é de maior interesse público é papel do Estado, Órgãos ambientais e sociedade civil.
Serão criados 1500 novos empregos, durante a fase de funcionamento. Não se sabe por quanto tempo a pesca será suspensa, nem podemos prever quanto tempo (20 -100 anos?) as populações biológicas levarão para se recompor e suprirem a demanda de cerca de 3000 pescadores artesanais tradicionais da área de influência de impacto do empreendimento.

A autorização para utilização dos recursos naturais e a permissão para produção de impacto ambiental estão condicionadas ao processo de licenciamento, que requer um estudo minucioso sobre as condições físicas, químicas, biológicas e antrópicas da área, realizado pelo empreendimento. A "área de influência" muitas vezes não contempla a abrangência territorial real dos impactos previstos. Sabemos da conectividade e interdependência entre os corais e os estuários, por exemplo. Assim, o Parque Estadual de Areia Vermelha será indiretamente impactado, como toda a barreira de corais da costa de João Pessoa, inevitavelmente.

Compensação Ambiental é outra flexibilização das normas para autorizar os impactos, muitas vezes não é cumprida e alguns impactos simplesmente não compensam.
Há, ainda, o prejuízo para o seguimento econômico da pesca, que se tornará mais escassa e cara

Recife, a cidade-estuário, é um exemplo típico de metrópole que há anos sofre com o racionamento de água, alagamentos, mal cheiro, ataques de tubarões, desigualdade social crescente, intimamente produzidos pela subtração do mangue.

Multinacionais apropriam-se dos recursos naturais de países atrasados, onde os lucros são altos, capital escasso, preço baixo da terra e dos salários, matéria prima barata, e aproveitam a permissividade do Estado, que cria o ambiente adequado para os negócios e investimentos, utilizando a premissa do interesse público pelo desenvolvimento econômico, em prejuízo da preservação e de um desenvolvimento socialmente justo, responsável e durável.

Daí a importância de se levantar o assunto para a sociedade participar igualmente desse processo decisório que vai ponderar qual interesse público deve prevalecer nessa balança de interesses. Qual o tipo de desenvolvimento que aspiramos para as nossas cidades?
 



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