Geral

Acabou Chorare & Je T´Aime Moi Non Plus


06/03/2012



Nem só de carnaval vive o mês de Fevereiro! Neste ano, tivemos a Mostra de Cinema, sempre lotada, quando tive a oportunidade de ver os filmes: Os Filhos de João e O Homem que amava as mulheres. Dois filmes sobre música, loucura, tudo lá pelos anso 60 e 70, tendo uma idéia de um tempo, outsiders, e compreendendo coisas que na época talvez não tivesse o alcance necessário.

O Documentário Filhos de João,O Admirável Mundo Novo Bahiano (Direção Henrique Dantas), sobre a trajetória do grupo Os Novos Bahianos, e a tentativa do grupo em ter uma vida livre e em comunidade. O filme tenta também mostrar o universo estético e filosófico do grupo através de depoimentos dos integrantes, compondo assim a história desses cabeludos, desde sua criação até o final. O documentário, ganhou o prêmio especial do júri e o voto do júri popular no Festival de Brasília 2009. Eram os tempos dos Hippies de Arembepe! Confesso que na época não me encantava muito por esse grupo, nem mesmo por Moraes Moreira, que só depois, em sua carreira solo, mas especificamente no ano que veio tocar no trio das Muriçocas, pude apreciar sua expertise e criatividade. Quanto à Baby Consuelo, gostava de sua loucura e irreverência cantando brasileirinho, menino do Rio, mas depois me espantei com os nomes dos filhos e da sua busca desenfreada por um loucura religiosa, se é que tenho esse direito de chamar assim.

O filme tenta falar desse grupo enorme de meninos músicos, que sonhavam em mudar o mundo, moravam em comunidade, amavam futebol e tocavam guitarra dia e noite. O pão nosso de cada dia pouco importava, e o dinheiro era guardado num saco plástico atrás da porta. Utopia? Acho que nem isso. Me pareceu uma certa inocência, possível na época do paz e amor, onde fumar maconha o dia todotodo dia, parecia permissivo, criador, e fugindo dos centros urbanos, os malucos beleza se arrumavam.

Tom Zé é a voz pensante do filme, que fala como se tivesse tomado um ácido alucinógeno, mesmo estando careta . A juventude na platéia ria daquele ser louco , e eu me esbaldava com tanta sabedoria a passear pelo tropicalismo, pelas guitarras de Jimmy Hendrix, pela ditadura, inclusive cultural do eixo Rio-São Paulo, pela Bahia, pela criatividade, e claro pela força astronômica de João Gilberto sobre todos eles.

Fiquei a me perguntar como aqueles bichogrilos sobreviveram? E claro que, também me vi naquela busca e loucuras. Entrevista com todos os componentes, e com cenas memoráveis como a de Baby dançando A Menina Dança. Entendi porque ponho sempre essa música na vitrola com Marisa Monte, e danço! É puro alucinógeno!
Dá uma certa nostalgia ouvir um monte de Senhores, hoje já tão bem comportados, a falarem das suas diabruras musicais e existenciais, e na ingenuidade de cada um. E fizeram história musical, e fizeram música. Muita! Pepeu Gomes também narra, descreve, e analisa o despreendimento, a comunhão, e a troca troca troca de todos. Era um outro mundo. Um outro cenário político, comportamental, urbano, musical, e amoroso, que hoje parece coisa de filme. E é!

Acabou Chorare, me fez chorar. De Saudade dos hippies, de Woodstock, de Je Taime moi non plus, de Alegria Alegria, e de que tudo mais vá pro inferno!

Coube ao cartunista francês Joann Sfar, escrever e dirigir, O homem que amava as mulheres – adaptado da própria graphic novel sobre Serge Gainsbourg, num longa-metragem que, está mais para uma fábula do que propriamente uma biografia filmada. O filme conta a estória do artista, pintor, músico francês Serge Gainsbourg, suas dúvidas e autodestruições, mostrando um homem que faz pouco da sua feiúra, fumando cigarros Galouise e sua densa fumaça.

Confesso que nos 60´s muito menina, não tinha alcance para achar aquele homem com cara de ressaca, interessante. Tinha até uma certa repugnância, e gostava muito mesmo era de Jane Birkin, quem eu achava linda, diferente, e que, com seus tubinhos de um palmo, fazia-me sentir mais à vontade, com o meu corpo de adolescente cumprida….

Amei o filme. E todo o recurso utilizado para falar da solidão e irreverência desde sempre daquele menino judeu que, encontrava no desenho/pintura/guache um refúgio do mundo real, para o seu próprio mundo. Um mundo sedutor diante da vida e depois, claro, para Brigitte Bardot. Fiquei conhecendo sua arte, sua música-de-bar-fim-de-noite, sua rouquidão; seu charme para com as mulheres, mas não só. Seu encanto pela existência, sexo , drogas e boemia. Serge cantou A Marselhesa ao som de Reggae, na Jamaica, e escandalizou os franceses. Sussurrou gemidos eróticos e nos fez gemer juntos com a explosão da revolução sexual dos 60´s. Sempre com sua sombra, seu alter-ego, no filme representado pela sua figura desenhada exageradamente como um Pinóquio do cotidiano, que lhe cochichava com a voz de diabinho, quais as escolhas a fazer, por vezes lhe contrariando os desejos em nome das oportunidades, como quando lhe orientou a cantar, e deixar sua paixão pela pintura, cores e formas, pelo cinza sombrio das fumaças dos bares soturnos parisienses, cantarolando canções típicas francesas a La Charles Aznavour.

Julieette Grecco, quel surprise ouvir esse nome! há muito esquecida nas minhas memórias. Lembrei também de Françoise Hardy e Tout Les Garçons….

Gainsbourg seduzia muito as mulheres lindas da época. Feio, franzino, narigudo, fumante, louco, artista, mas que trazia na sua alma, sua infância ensimesmada na praia, criando suas figuras iluminadas, num tempo de guerra, onde ser judeu tinha sim um carimbo estigmatizante, mas que ele, na sua voz, na sua arte, e na sua condição de amoreuse, viveu, e amou, loucamente à vida.

Vi os dois filmes seguidos, numa maratona de pipocas, e saí do cinema às 11 da noite, completamente inebriada pela música dos Bahianos e da Chanson Française à beira do piano, com os anos 60 me anuviando a cabeça de menina da época, mas já antenada com os ventos da contracultura, com paz e amor, e que tudo o mais iria para o inferno. Os anos passaram, e até hoje, guardando as devidas proporções, também me sinto uma sobrevivente….

Depois também de ver, um outro filme, A música de Tom Jobim, e ouvir Wave e Insensatez; de cantar essa menina dança, revira os olhinhos, e gemer Je taime…me deu ainda mais pré-conceito dos forrós de plástico, de música sertaneja das calcinhas pretas, e de tantas pobrezas culturais a que assisto cotidianamente. Será mesmo que é rabugice rejeitar esses grupos com mulheres vulgares rebolando a bunda rica de frufru, cantando nada, ou música de péssimo gosto e harmonias? Ora Ora, quem teve João Gilberdo Din Din, Tom Jobim é pau é pedra; Elis atrás da Porta; Betânia Carcará; Caetano Jóia Rara; Gal Baby; Baby Menina Dança; Roberto Calhambeque; Erasmo festa de Arromba; Renato Feche os Olhos; Edu Ponteio, e Chico Sabiá, não dá para se contentar com pouco!

Um abraço pelo Dia Internacional da Mulher.

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa , Fevereiro 2012



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