Geral

A Magia do Natal


28/12/2010

 A Arte existe porque a vida não basta
(Ferreira Goulart)

Todo ano é a mesma coisa. A gente só reclama do fuzuê das festas de final de ano; de tanta festa; de tanta fila; de tantos presentes; de tanto tanto…É a urgência inadiável de tudo que tínhamos por fazer e não fizemos, e no final do ano, queremos porque queremos.

Eu, não gosto de deixar nada para a última hora. Não sei comprar nada sob pressão. E, apesar de adorar dar presentes, no Natal de hoje em dia, só os pequenos são agraciados. Mesmo assim, na véspera de Natal, tive que comprar um presente no Boticário, e fiquei impressionada com a multidão comprando presente padrão para todos. Dez sacolinhas iguais, com sabonetes, perfumes ou hidratantes. Presentes em série! Eu não gosto de presentes em série! Gosto de garimpar coisas. Coisas a cara de cada um. Coisas originais, e com o meu toque pessoal. Até mesmo na embalagem capricho: seja de papel jornal, crepom rosa ou celofane. Lembro de uma vez, para diferenciar os sobrinhos Galeses dos Paraibanos, embalei os estrangeiros todos com papel crepom azul, vermelho e branco, para homenagear à bandeira Britânica. Acho que nem a Rainha se deu ao trabalho! E isso passa longe de uma obrigação. Tem o nome de prazer. E percebo que poucas pessoas tem esse gesto, pois preferem as filas e a praticidade do Boticário, que também adoro , diga-se de passagem. L´Occitane, Natura, Body Shop, todos os sabonetes e aromas…

Pois dia de Natal, recebi um presente único. Uma embalagem de papel celofane fúcsia já se apresentava…Envolto nos sete véus, uma escultura linda, uma casa de passarinho, um João de barro? Talvez. Feito com argila , amor e carinho. Ao abri-lo fiquei emocionada de ver que tinha sido agraciada com o tempo, a dedicação, o zelo, o amor, da artista provedora, que é realmente uma fada, no sentido do bom gosto, da arte, e de tudo isso que citei acima, como a arte de presentear. Cada presente, uma feitura. Cada gesto, um tempo.

Ao ver o ninho da pequena, singela e tão linda escultura, não pude deixar de me reportar ao filósofo Bachelard, com sua Poética do Espaço, e todos os seus cantos, conchas, gavetas, porões, cabanas e sótãos. Para Bachelard, “descobrir um ninho leva-nos de volta à nossa infância, à uma infância. A infância que deveríamos ter tido…O ninho é um esconderijo da vida alada…Os homens sabem fazer tudo, menos ninhos de pássaros…Ou ainda, O ninho é um buquê de folhas que canta…”

Como não fazer referência também a um conto da escritora Neozelandesa, Katherine Mansfield, The Canary, onde a personagem relata sua intimidade com o canário morto, seu cotidiano em busca de um animal de estimação, sua relação onírica com a natureza, para finalmente encontrar empatia no canário presente. Coincidentemente, esse conto foi o último escrito por essa mestre do conto moderno, pois na manhã seguinte chegou a falecer de tuberculose, ainda no auge dos seus 32 anos. E nesse mesmo conto, a personagem faz uma analogia da morte do passarinho, com a sua própria morte eminente, e o medo maior que nos assombra cotidianamente, o da finitude da vida. Finitude essa também compartilhada pelo personagem de Virginia Woolf no filme As Horas, quando da cena da morte também de um passarinho, e que a própria Woolf, também numa cena de foreshadowing, pressente sua própria agonia, já quase em tempos de mergulho profundo.

Mas o meu passarinho não tem nada a ver com finitude, nem com essa digressão literária. O meu passarinho foi o canto do rouxinol , não aquele cantado por Oscar Wilde em The Nightingale and The Rose, mas igualmente um passarinho que me trouxe à arte no dia de Natal. E o meu presente especial, como uma amiga concluiu, significou, a própria magia do Natal, que junto com meu panetone no café do dia seguinte; do telefonema saudoso e inesperado da Austrália do meu sobrinho Pedro; de alguns cartões/mensagens especiais; um encontro inesperado com amigo que há anos não via, Ivanóe e Junko, e mais uma pilha de louça do almoço, resultado das comemorações festivas para à aniversariante natalina, minha mãe (83), lavadas e enxaguadinhas carinhosamente pelo meu companheiro, exercitando mais que nunca o saber das pequenas e micro empresas, e que por entre passas e damascos…., chego até a acreditar que Papai Noel existe…

Obrigada Marieta, sobrinha querida, pelo lindo presente.

Feliz Ano Novo: cheio de luz e alegria, sem perder a magia jamais.

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 27 de dezembro , 2010



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