Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

O terceiro ditador


03/07/2015

Foto: autor desconhecido.

O impedimento de Costa e Silva continuar à frente do governo, do qual já estava afastado por motivo de doença, e substituído por uma Junta Governativa, composta por comandantes das Forças Armadas, fez com que os militares começassem a pensar, de forma mais objetiva, na sua sucessão. O primeiro ponto, do qual não abririam mão, era o de não entregar a chefia do governo a um civil; este teria que continuar nas mãos de um militar. Em segundo, simular uma eleição que pudesse oferecer uma conotação de democracia ao evento.

Como eleger o novo presidente, se não tinham a menor intenção de promoverem um pleito com o voto do povo? Só havia uma saída: reabrir o Congresso, que havia sido fechado em 1968, por ocasião da edição do AI-5, e realizarem uma eleição indireta. E assim fizeram. A ARENA, partido de sustentação da ditadura, apresentava as candidaturas do General Emílio Garrastazu Médici, para presidente, e o Almirante Augusto Rademaker, como vice-presidente. O MDB se negou participar desse simulacro de eleição. Até porque, numa primeira análise, já se observava a cassação do legítimo vice-presidente, Pedro Aleixo. Dessa vez, não queriam correr o risco de colocar na linha de sucessão alguém que não fizesse parte das forças militares.

Assistíamos essa encenação política, própria dos ditadores, inteiramente incapacitados de qualquer reação. Ninguém podia sequer manifestar-se contrário à idéia. O povo brasileiro era mero expectador dos acontecimentos, mesmo sendo a parte mais interessada.

Na tarde do dia 25 de outubro, a Câmara dos Deputados e o Senado, em sessão extraordinária conjunta, davam efetividade à farsa eleitoral. Foram consignados 293 votos em favor da chapa apresentada, enquanto 75 parlamentares se abstiveram de votar. O Brasil naquele dia conhecia oficialmente o nome do governante que iniciaria a “fase 3” da ditadura militar.

A posse aconteceu no dia 30 de outubro. Naquela época não tínhamos ainda noção do que estaria por vir. Deu-se por principiado o mais violento período da ditadura militar, implantada a partir do golpe de 1964. O seu governo se destacaria como o que mais se valeu da repressão e da censura para inibir qualquer manifestação civil contra o regime. Prisões injustificadas, torturas, desaparecimento de pessoas e assassinatos eram práticas que se tornaram comuns nos subterrâneos da ditadura.

Entretanto, a propaganda do governo não nos deixava saber dessas ocorrências com detalhes. Sabíamos apenas que o medo imperava na população e que seria considerado crime de lesa pátria qualquer atitude que pudesse ser classificada como subversiva ou opositora ao sistema. O terror e o pânico desestimulavam até a simples formulação de uma opinião que não se ajustasse ao pensamento dos que se diziam “agentes da revolução”.

Entrávamos no mês de novembro, entregues ao poder de mando do mais atroz e severo ditador da era dos “anos de chumbo” que a nossa história conheceu.

• Integra a série de textos “INVENTÁRIO DO TEMPO II”.


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