Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

A Grande Beleza de: Juventude


22/06/2016

Foto: autor desconhecido.

Não adianta! Não vamos ser lembrados por muito tempo! Estamos fadados ao esquecimento. Por mais barulho que façamos. Rei morto, rei posto! Já diz a sabedoria popular.

Lembrar, um dos temas do filme Juventude, de Paolo Sorrentino e os enigmas e tédios da velhice. O seu outro filme – A Grande Beleza (2013), um escritor com fastio de criação, Jap Gambardella, se perguntava: onde está a beleza? O que é importante para nos determos diante da banalidade das festas, luxúrias, arte, intelectualidade, frase feitas, literatura? O que é uma grande estória? Parece que, o que ficou na memória do escritor foi, a primeira noite de um homem e/ou a empregada que gostava da pilhéria de ser chamada de safada! Nada mais frugal! Sou um homem comum! (Conferir outro filme – Whisky!) . Talvez Einstein seja/é lembrado. E ponto. Vivemos em busca de sermos amados, lembrados, cristalizados. Mas a transitoriedade é fato. Apagamento. Deletado.

Em Juventude, temos o tempo e o que fazemos dele ao longo da vida. Com quem dormimos? Que conversas tivemos? A infância? Uma imagem de um guidão de bicicleta? Do que sentes falta? Da minha mulher! O momentum! Novalis disse: “estou sempre indo para a casa do meu pai!” O que dizer no leito de morte? /Perdi os melhores tempos com você. Gostar da vida.

A cena? a velhice e seus corpos velhos, doentes, inertes, apáticos, disformes, enevoados. Corpos des-nutridos, que buscam: lama, massagens, saunas, banhos, filas, toques, nados, jogos, fisioterapia, alturas. Desejar é preciso. Aquele desejo que nos move ao levantar da cama para encarar a vida. Face The Hours! Fazer xixi ou não fazer xixi – uma questão! O que podemos pingar de conforto num dia a dia que já não temos o ritmo, a presteza de quando somos jovens? E temos uma montanha como metáfora do tempo. Se olhamos de perto, temos o futuro, o ser jovem. Se longe, a velhice, o passado.

O cenário do filme é um SPA de luxo nas montanhas da Suiça .O silêncio! Os ventos e véus! Os personagens, Fred (Michael Caine, estupendo), um maestro aposentado e apático diante da vida , mas que já foi “um rei entre os lençóis”; Mika (Harvey Kietel), um diretor de cinema entusiasmado sempre com um novo projeto, e seus testamentos vários. Mas também temos : Lena, a filha do maestro abandonada pelo marido, Julian, mas que também é boa de cama, o seu marido e o novo desejo – uma popstar, Pamela Faith; jovens aprendizes de roteiro; uma menina que dança karaokê; mais outra menina que roe as unhas , e uma outra que usa óculos e que faz programas no SPA, inclusive passear de mãos dadas; um menino canhoto que arranha um violino; um dublê de Maradona obeso, também canhoto; um casal que não conversa em público mas que grita nos orgasmos na floresta; um ator em crise – Hi Hitler!; Um alpinista, Luca, que não teme a vertigem e gosta de relógios; um monge que não levita; uma atriz em decadência – Barbarela ou Marylin?; Uma mulher que não se pode levar para cama na juventude – Gilda Black!, E uma Miss Universo, que sabe o que é ironia e que esfrega acintosamente seu corpo e sua juventude diante de dois velhos estarrecidos.

Toda essa gente e um palco giratório que abre o filme com uma música meio retro e boa de dançar, para animar a placidez e calma do lugar, mas também fazendo o contraponto com os personagens zumbis que se espalham nos jardins, enquanto a câmera faz uma panorâmica desse personagens que transitam pela paisagem idílica de busca pelo tempo.

Um registro especial para a cena em que Fred, já cansado da vida, encontra refugio na natureza, e ali, sentado num toco, observa a magnitude da floresta e das vacas e dos bois. E numa sinfonia suave e bela, rege os sinos, e os muuuuuus! Ou ainda quando a filha (Rachel Weiz) sonha com a popstar que lhe rouba Julian, por ser boa de cama. Um clipe de sexo, mentiras e velocidades.

E o que conversamos na vida? Uma filha que se queixa da falta dela. Mágoas, rancores pelos não ditos! E ela acusa seu pai maestro: “Você só tinha a música, que ocupava todos os lugares. Quieta Melanie!” Depois Fred pergunta à sua esposa, uma Melanie decrépita: “O que os filhos não sabem dos pais? De como tremi quando te vi a primeira vez! Os filhos não sabem da fragilidade dos pais, da paixão dos pais. Os homens não contam as coisas”.

Mas o que emociona as entranhas é a cena final do filme. Fred finalmente aceita reger suas “Canções Simples” para a Rainha. E tem a sua epifania, e nós espectadores a nossa, ao se emocionar com um batom vermelho da soprano, com as lembranças do túmulo do amante, Stravisnky, e com o rosto velho e demente da mulher Melanie, interna em Veneza. Com os desfecho das emoções, e tudo o que temos nessa vida: passear, escalar, dançar, tocar, nadar, cantar, gritar, ouvir…

O monge levita, a menina de óculos se liberta, Miss Universo nua se banha ao “gaze” dos velhos, o ator opta pelo desejo e não mais pelo terror de interpretar quem não lhe importa, o maestro visita a mulher, o túmulo do amante, e rege suas canções, Lena mergulha nas alturas literalmente, Mike, não suporta o não e suas personagens divas, e salta para deixar o seu testamento real. E “Barbarela” vai em busca do dinheiro e da casinha em Miami, e da vida?

O que te espera do lado de fora , a juventude perdida ou não. Uma vertigem, um abismo, um acorde, um olhar, uma reminiscência, um calafrio, um sussurro, uma dança…Perder o controle – sentir-se completo – vivo de novo – Eu vivo para você! Ouvir você chamar meu nome! Diz a letra da canção!

E Mike faz seu último enquadramento.

Eu também fiz o meu! Mas ainda não foi o último….Gracias!

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa 16 de junho,2016
 


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