Economia & Negócios

Chefe do Departamento de Economia da UFPB analisa problema da dívida pública brasileira


05/07/2018

O professor Paulo Amilton, chefe do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), analisa o problema da dívida pública brasileira, em novo artigo publicado nessa quinta-feira (05). O artigo semanal é uma parceria do Departamento de Economia da UFPB com o Grupo WSCOM.

Confira a íntegra do artigo:

O problema da dívida pública brasileira

Por Paulo Amilton Maia Leite Filho

Pelo que eu, e meus oito leitores, estamos lendo nos meios de comunicação, parece-me que os candidatos a presidente ainda não entenderam a situação da dívida brasileira. A maioria tem um entendimento muito simplificado da situação e propõe soluções que são dignas de Henry Louis Mencken, que afirmou, “para todo problema complexo há uma solução que é simples, elegante e errada”.  E olhem, o Brasil já passou por um processo eleitoral em que a candidata que logrou vitória negava peremptoriamente durante toda a campanha que não existia problema fiscal e quando assumiu mudou o discurso. Os principais candidatos atuais estão com muita vontade de cometer novamente outro estelionato eleitoral.

Em monografia intitulada “Dívida pública mobiliária e o mercado de títulos públicos no Brasil: uma análise pelo modelo de sustentabilidade” aprovada pelo Departamento de Economia da UFPB, o aluno Iago Ramalho de Holanda Furtado mostrou que “……a dívida mobiliária federal do país, segundo o tesouro nacional, cresceu de 2016 para 2017, 14%, somando R$ 3,559 trilhões com prazo médio de resgate de 4,3 anos. Assim, observa-se que há aumento na velocidade do crescimento da dívida com o prazo consideravelmente curto, indicando que o governo não está conseguindo emitir títulos com prazos mais longos e está pagando um prêmio (juros) alto para cobrir os déficits em seu orçamento”. Os 3,559 trilhões representam aproximadamente 48% do PIB. 

A dívida reflete a política de gastos e estes têm uma tendência de aumento persistente, e esta não é um mero acidente. Várias fontes de dados mostram que o governo federal, e suas unidades subnacionais, vem persistentemente aumentando os gastos. No caso dos gastos federais, que têm como principal fonte a previdência, INSS e funcionalismo, que em 2016 atingiram 11% do PIB contra 9% do PIB em 2010. No caso dos outros entes subnacionais o cerne dos gastos é o funcionalismo, cujo montante atingiu 9,1% do PIB em 2017.

Analisando mais detidamente os gastos percebesse que houve um aumento de 4% nos gastos em relação ao PIB. Desses, 3,3% se referem aos benefícios previdenciários e pagamento do funcionalismo público. Ou seja, 80% do aumento dos gastos se deve apenas a duas contas. 

E o que os candidatos falam sobre estes números. Até o momento nada. Nenhuma política de controle de gastos foi colocada na mesa para algum debate. O que se ler é mais do mesmo. Imposto sobre herança, cuja capacidade de gerar arrecadação é sempre colocada em dúvida, cobrança de dívidas de empresas, muitas delas já falidas, etc. A fantasia que mais gosto é a que fala em dar um calote na dívida sob o argumento de que o volume pago de juros até hoje já teria feito o Brasil ter saldado a dívida num múltiplo maior que dois. A esta fantasia lembro-me de Mário Henrique Simonsen descrever uma cena ocorrida com o Deputado Ulisses Guimarães.  

O Brasil vivia sob os auspícios do governo José Sarney e o senhor Ulisses Guimarães exercia uma influência enorme. Ele começou um discurso de romper com o FMI e dar um calote na dívida, fato que aconteceu mesmo. O argumento era este surrado de que o volume de juros pagos pelos sucessivos governos brasileiros já era mais que suficiente para saldar a dívida. Pois bem, o senhor Ulisses Guimarães alugava um apartamento em São Paulo havia 35 anos a um mesmo inquilino. Este ao ouvir a ladainha do pagamento dos juros foi a câmara e procurou o senhorio do imóvel, que era o senhor Ulisses Guimarães. Afirmou o inquilino, “senhor Ulisses Guimarães, alugo seu imóvel há 35 anos e o volume de aluguéis que já lhe paguei é mais do que suficiente para quitar o imóvel. Portanto, vamos ao cartório de imóveis para lavrar a escritura transferindo o imóvel para minha pessoa”. 

O senhor Ulisses Guimarães não gostou muito da argumentação do inquilino, mas esta é idêntica àquela do montante dos juros já pagos. Substitua o imóvel pelo volume de capital emprestado, o senhorio Ulisses Guimarães pelo detentor do capital, o inquilino pelo tesouro nacional e os aluguéis pelos juros pagos e temos o mesmo caso. Evidentemente que se deve devolver ao proprietário do imóvel quando o inquilino deixa de alugá-lo, como se deve devolver o capital emprestado ao detentor do mesmo. Esta devolução é chamada de rolagem da dívida, que constitui na troca de um título público que está perto de vencer por um outro com prazo mais longo, denominada de alongamento da dívida. É justamente a dificuldade de alongar a dívida com juros menores que o tesouro nacional está tendo no momento e isto se deve as incertezas da economia brasileira.

Incerteza esta que não é dirimida pelos atuais candidatos a presidente, pois os mesmos não têm coragem de tratar sobre este assunto, ou não tem conhecimento do tamanho do problema que se constituiu a dívida pública brasileira.  Pobre sociedade brasileira.         



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