Economia & Negócios

Professor comenta o papel do engenheiro no nicho profissional da economia

NOVO ARTIGO


08/02/2018



 O professor de economia da Universidade Federal da Bahia (UFBa), Wilson Ferreira Menezes, explica, em se artigo desta quinta-feira (8), o papel do engenheiro no nicho profissional da economia.

 Segundo ele, "a inclusão desse profissional nesse nexo cooperativo é vital para se alcançar uma boa saúde empresarial".

Leia:

'O PAPEL DO ENGENHEIRO NO NICHO PROFISSIONAL DA ECONOMIA

 Wilson F. Menezes
Professor da UFBa

O artigo passado redeu um comentário do Prof. Amilca Baiardi da UFRB, que com muita pertinência sinalizou a ausência do engenheiro no nicho profissional fruto da cooperação entre o economista, o administrador e o contabilista. A inclusão desse profissional nesse nexo cooperativo é vital para se alcançar uma boa saúde empresarial. Em verdade, tratei dos condicionantes de controle de uma empresa, de maneira que o engenheiro, bem como o biólogo, o físico, o matemático, o agrônomo ou qualquer outra profissão, não pode ser esquecido quando se aborda a razão de ser de uma firma, ou seja, aquilo que fornece a condição física para sua existência.

 São as aplicações dos conhecimentos específicos que permitem a formação de um produto, de maneira que essa especificidade fornece, em verdade, a alma de um empreendimento. Sem o acompanhamento da engenharia, por exemplo, dificilmente se pode falar de lei dos rendimentos decrescente, escala de produção, escopo de produtos, mudanças técnicas e inovação tecnológica. Vejamos alguns exemplos em que as coisas jamais ocorreriam sem a presença do engenheiro, pelo menos nas formas que se verificaram.

 Adam Smith em 1776 pensou a divisão do trabalho como uma especialização de tarefas, em que cada trabalhador se dedicava a uma única etapa da produção. Em seu célebre exemplo da fabricação de alfinetes, a aplicação desse princípio permitiu aumentar bastante a eficiência do trabalho, com isso a produtividade laboral foi acelerada e o nível de produção aumentou de maneira jamais vista. A essa problemática Charles Babbage, engenheiro, matemático e físico, apresentou em 1834 uma mudança bastante inusitada. A divisão do trabalho concebida por Babbage foi baseada nas diferenças de competências e capacidades dos trabalhadores. É a diversidade dessas competências que permite aplicar o princípio à divisão do trabalho e não ao contrário como queria Smith. Essa orientação identifica não apenas o plano físico, mas também das capacidades e competências intelectuais. Tendo inventado a primeira máquina de calcular, Babbage enriquece os métodos de medida e de cálculo econômico por meio de uma análise fina das tarefas e da medição dos seus custos, permitindo assim valorizar o trabalho e otimizar o próprio salário pago a cada tipo de trabalhador. As tarefas são distintas, logo os salários devem ser diferenciados. Na concepção de Babbage, deve-se pagar o mais próximo possível do que vale efetivamente o trabalho. Lança assim um novo horizonte ao universo da gestão, quando se põe a calcular o custo de cada operação, priorizando a mecanização para as tarefas mais caras. Não é demais dizer que ele se preocupou mais com o sistema de máquinas que com a divisão do trabalho, de sorte que, sem dúvida foi um grande precursor da linha de produção.

 Frederick Taylor, engenheiro mecânico, em 1911, com seu livro Princípios da Administração Científica, resolve dois grandes problemas presentes no processo produtivo. Para ele todo trabalho cooperativo requer uma coordenação para ordenar os procedimentos processuais, centralizar as atividades e suprir os materiais relativos à produção. Além disso, o “total” controle do processo produtivo requer imposições ao trabalhador, tanto na forma quanto no tempo de operação, somente assim se pode habituar o trabalhador às suas tarefas. Exigências de cooperação e obediência são, portanto, necessárias; para tanto, Taylor explorou a destreza do melhor trabalhador e a impôs a todos os demais em cada tarefa específica da atividade produtiva. A melhor maneira de fazer uma tarefa no menor tempo possível, foi seu propósito. Para tanto, classificou e tabulou o conhecimento tradicional, reduzindo-o a regras e fórmulas simples a serem seguidas por todos. Baniu o trabalho intelectual da oficina, centrando-o no departamento de planejamento da firma; o trabalho cego do operário passou então a ser vigiado em seus mínimos detalhes. A gerência deve tudo comandar.

 Henry Ford, engenheiro de formação, após observar a produção de um aviário, inverte o sentido operacional da mesma. Foi então criada a linha de montagem, incorporando uma nova dinâmica na produção de carros, até então feita de maneira artesanal. Na linha de produção o trabalho passa diante do trabalhador. Preso ao seu posto, ele participa do processo de trabalho em um ponto da linha, com isso o pagamento pode ser feito por tempo, sem perda de controle, já que o movimento da linha se impõe a todos. Estava criada a produção de massa, para um consumo de massa. Todos poderiam escolher o carro que quisesse, desde que fosse o Modelo T preto. Isso somente foi possível com a padronização rigorosa de todas as peças constitutivas do carro.

 Alfred Sloan, engenheiro elétrico formado pelo MIT, atropela a concepção de Ford ao trazer à tona uma produção de massa com diversificação do produto. Com Sloan, a GM passou a produzir vários modelos de carros cada um em três apresentações: padrão, luxo e superluxo. Saia o magazine a preço único da Ford e entrava a supermercado onde cada um poderia escolher um carro adequado às suas preferências, escolhas e orçamentos. Para tanto, Sloan dividiu a GM em quatro departamentos autônomos e orientados para cada tipo de cliente. Aboliu a concepção de integração vertical da firma, quando passou a focar na produção específica do carro em si, de maneira que a subcontratação de fornecedores e máquinas semiespecializadas, adaptadas aos diferentes modelos, passou a ser largamente utilizada. Por outro lado, orientou uma comercialização agressiva, por meio de estímulo à mudança do produto a cada ano (inaugurando a “moda” do carro) e aos ganhos de escopo com seus inúmeros modelos. O resultado não podia ser diferente, impôs muita dificuldade a ação da concorrência.

 Taiichi Ohno, engenheiro mecânico da Toyota, foi “ao infinito e além” (como disse Buzz Lightyear em Toy Story) em termos de escopo produtivo. Ao proporcionar uma integração entre pesquisa, desenvolvimento e processo produtivo, Ohno revolucionou mais uma vez a indústria automobilística. Toda a produção passa a ser puxada pelas variações da demanda. Alta demanda, mais produção, baixa demanda a desacelera. Dois mecanismos foram acionados: a coordenação horizontal das atividades e a rotação do pessoal entre as unidades de trabalho. O primeiro aplica os chamados “just-in-time” e “kanban”; enquanto o segundo aponta a necessidade de se assegurar uma polivalência ao trabalhador. A concepção de montagem do preço foi então completamente alterada, antes se adicionava uma margem de lucro aos custos de produção, agora comprimem-se os custos para aumentar os lucros, já que os preços são rígidos e atrelados à concorrência internacional. A Toyota passou então a produzir o que já foi vendido, chegando a dominar um terço do mercado americano de carros. Para tanto, máquinas bem mais flexíveis foram adicionadas ao processo produtivo, além de acionar toda uma orientação para eliminar os tempos “mortos” de produção, reduzir o tempo de transferência das peças e de manutenção das máquinas, dentro de um princípio de melhoria permanente de todo o processo.

 Muito da nossa condição de vida e de bem-estar social devemos a ação dos engenheiros. Atualmente o mundo convive com a chamada 4ª Revolução Industrial. Tecnologia, informação e organização estão sempre presentes nos processos de inovação industrial, muitos deles comandados por engenheiros (Google e Apple apenas para lembrar). Lamentável e infelizmente nesse tipo de inovação o Brasil está atrasado, nossa indústria regride, ao tempo em que se consolida a exportação de grãos e metais. Os 13 anos da PeTralhada muito contribuiu para isso, na medida em que a arrecadação de impostos (uma carga similar à média da OCDE) financiou obras equivocadas em suas finalidades, mas que também alimentou o roubo e a rapina de nossos recursos públicos. O país enfrenta hoje a pior crise de toda sua história: econômica, social e, sobretudo, moral. O futuro chegou para o mundo, mas Pindorama tonto como um cabra-cega caminha para o passado. Paradoxalmente, os engenheiros sociais nos devem muita explicação. Sabem prometer, mas não cumprir. Nem poderia.'



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