Economia & Negócios

Professor de Economia da UFPB fala sobre a causalidade encontrada na rua

DEPART. DE ECONOMIA


26/01/2018



O professor de economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Erik Figueiredo, fala sobre a causalidade encontrada na rua. O artigo semanal é uma parceria do Departamento de Economia da UFPB com o Grupo WSCOM.

Segundo o especialista, é preciso combater a pesquisa empírica ruim e estabelecer relações causais.

Confira o artigo na íntegra:

A causalidade encontrada na rua
Por Erik Figueiredo

Pesquisas recentes, em especial nas áreas de ciências sociais aplicadas e biomédicas, têm demandado instrumentais capazes de estabelecer relações causais. Afinal, de que vale afirmar que uma maior número de armas em poder da população esta associado a um número maior de crimes, se não é possível demonstrar que a posse (ou porte) dessas armas causam o crime? Ou, de uma outra forma, qual a utilidade de associar determinados comportamentos na gravidez — como o ato de consumir álcool e/ou cafeína — ao aborto espontâneo, se não há evidencia sólida para demonstrar que os comportamentos fora do padrão causam o aborto? Enfim, poderia gastar mais alguns parágrafos listando exemplos, mas o objetivo deste artigo é demonstrar que a obtenção de uma relação causal enfrenta dois tipos de problemas: o primeiro de ordem técnica, uma vez que os métodos demandam maiores esforços intelectual e computacional. O segundo, mais interessante para essa coluna, diz respeito as crenças pré-estabelecidas que as relações causais possuem.

Não vou me deter muito na questão técnica, mas não posso deixar de citar as referências fundamentais dessa área, são elas: "Angrist, J. and Pischke, Mostly Harmless Econometrics: An Empiricist's Companion, Princeton University Press, 2009” e "Imbens, G. and Rubin, D. Causal Inference for Statistics, Social, and Biomedical Sciences: An Introduction, Cambridge University Press, 2017”. Estes são os livros que devem guiar os estudos dessa área da econometria. Eles são indicados para aqueles que não temem transitar em meio a métodos empíricos complexos.

Contudo, como já mencionado, as crenças relacionadas as relações causais são mais interessantes. Usarei alguns exemplos para ilustrar meu raciocínio. Parece não haver duvida de que fumar causa câncer; também não se discute que o ato de tomar café durante uma gravidez pode estimular o aborto espontâneo; ou de que uma política de qualificação dos trabalhadores aumenta as suas chances alocação no mercado de trabalho. Tudo isso parece obvio, porém, a determinação dessas causalidades está longe de ser trivial.

Poderíamos jogar dúvidas simples do tipo: gravidezes saudáveis geralmente são acompanhadas por enjoos intensos fazendo com que as mulheres evitem bebidas à base de cafeína. O inverso seria aplicado a gravidezes pouco saudáveis. Logo, a pergunta central para um estudo nessa área seria: o ato de tomar café estimula o aborto, ou mulheres com alta probabilidade de abortar possuem menos enjoos e, por isso, tomam mais café? Outra crença muito famosa no meio da sociologia do crime, a teoria das janelas quebradas, postula que há mais crime em localidades com maior degradação, isto é, com praças abandonadas, muros caídos e janelas com vidros quebrados. Sendo assim, embelezar esses locais ajudará a combater o crime. Não precisamos ir longe ir longe para encontrar uma aplicação dessa teoria, basta lembrar que um candidato da esquerda carioca chegou a afirmar que o problema da criminalidade do Rio de Janeiro poderia ser combatido iluminando as ruas. Neste caso, poderíamos questionar: a alta criminalidade nessas localidades é fruto das janelas quebradas ou; as janelas estão quebradas porque lá existe crime? Em ambos os casos, aceitar a crença inicial faz com que os formuladores de política foquem em um elemento não causal, tornando a ação não eficiente. Ou seja, combate-se o café, a redução aborto não é observada. Iluminam-se as ruas, pintam-se as fachadas das casas e a criminalidade não é reduzida. Precisamos combater a pesquisa empírica ruim. Precisamos estabelecer relações causais. Chega de "causalidade encontrada na rua”.
 



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