Economia & Negócios

Em artigo, professor da UFBa critica inoperância da esquerda

INOPERANTE


02/11/2017



O professor de economia da Universidade Federal da Bahia (UFBa), Wilson Ferreira Menezes, critica em seu novo artigo no Portal WSCOM a inoperância da esquerda brasileira. "Estes não costumam enganar, acabam falando mais alto que o clamor da arrogância, garantida por dogmas esclerosados", diz.

Confira abaixo:

PARA UMA CRÍTICA À ÓPERA DA INOPERÂNCIA DA ESQUERDA BRASILEIRA

Wilson F. Menezes
Professor da UFBa

“Allons enfants de laPatrie…” Não, não é isso. “Debout, lesdamnés de la terre…” Também não. “Prolétaires de touslespays, unissez-vous!” Ah, é isso. Falemos disso então. Nada mais falso no sentido científico, nada mais enganador no sentido moral, mas também nada mais perigoso no sentido político, que essa exclamação. Vejamos porquê. Como podem os proletários do mundo se unirem, se diferentes sistemas sociais, técnicas, organizações do trabalho e culturas os separam. Esqueceram, tal como Mister Peel, as relações de produção? Isso, portanto, somente é desejado por voluntaristas, no pior sentido do termo, que nada auxilia no entendimento dos fatos. Estes não costumam enganar, acabam falando mais alto que o clamor da arrogância, garantida por dogmas esclerosados. Perder os grilhões e ganhar o mundo, eis o Éden como meta prometida, mas entregam o inferno. Foi assim na Rússia, na China, em Cuba, no Leste Europeu, no Laos, na Venezuela etc. Onde quer que tenham dominado politicamente sempre entregaram não as promessas, mas um mundo de sombra e tormenta. Não poderia ser diferente. Por quê? Ora, ora, os motivos são muitos.

Primeiro, a união faz a força, é verdade. Mas essa união somente se verifica à custa de uma simplificação do homem, imposta pela própria divisão técnica do trabalho. Com efeito, essa divisão foi muito marcante até 1860, se é que podemos datar de maneira tão precisa, que se imaginou perdurar por todo o sempre. Não durou. A indústria ocidental, comandada pelos EUA, passou do artesanato industrial à linha de produção à la Chaplin, depois vieram os múltiplos modelos a partir de uma mesma estrutura padrão. Saímos do bonmarché de Ford e entramos na era da boutique de carros de Sloan com a GM. Mas não parou aí, pois em seguida vieram os japoneses com Ohno na Toyota, levando a informação da demanda como critério de impulsão da produção. Tudo estava no seu reverso: informação vem, produção vai. Se a demanda diminui, suprimem-se alguns empregos, mantendo-se os postos. A “desespecialização” do trabalho comandou a festa. Nada mais diferente em relação à indústria do século XIX. Mas voltemos a 1860. Aquela divisão do trabalho tão pormenorizada, jamais poderia produzir o homem que lideraria a política e comandaria as grandes transformações revolucionárias tão desejadas então. Isso porque esse homem foi, pouco a pouco, perdendo a noção do seu trabalho como um todo, na medida mesmo que se especializou em tarefas simples e repetidas ad náusea. É, talvez, esperar demais desse homem. Dividido no trabalho, por definição, ele não poderia obter a noção de conjunto da sociedade. Afinal o próprio Marx nada esperava dos sindicatos. Fica a questão: como unir na política, o desunido pelos fatos? Somente o PeTralhas tentaram o ridículo de financiar ditaduras na América Latina e África, às nossas custas é claro.

Segundo, o economista austríaco BohnBawerk detectou uma grande incoerência entre o sistema de valores baseado no trabalho e o sistema de preços. Não havia ponte entre um e outro. Como o sistema econômico é, até hoje, comandado pelos preços, fica claro que o problema se encontra do lado do valor. Ponto. Questões importantes ficaram sempre em aberto. Como reduzir o trabalho qualificado em quantidades de trabalho simples? Como impedir que a demanda marcada pela subjetividade deixe de influenciar a formação de valores? O que fazer com a oferta, quando se sabe que valor não vendido é perdido? Claro que nessas circunstâncias o preço vai a zero, muito embora o trabalho tenha acontecido. As tentativas de solução para essas dimensõesnon sequitur requerem um sistema de equações lineares, muito similar ao empregado por Walras na formatação de seu equilíbrio geral. Contudo, a aplicação desse instrumental matemático, sem considerarimportantes restrições, costuma apresentar situações de preços negativos. Algo inimaginável no âmbito da economia. Bem, até hoje não se tem uma solução razoável para esses problemas, dentro de uma lógica que não renegue a realidade. Mas as coisas não pararam aí. Como na etapa superior e imperial do capitalismo, onde ainda se verificava a exploração colonial, se pode ter valor, quando o que se tira da colônia é o fruto de um não trabalho no sentido das relações de produção do próprio capital? Ora, passa-se a ter um valor na sociedade imperialista, formado com grandes porções de não-valor, no mínimo um contrassenso.

Terceiro, a formação dos grandes oligopólios se deu na economia americana entre os anos 1860 e 1900. Isso naturalmente ocorre depois do advento das ferrovias e por causa delas. A conquista de uma distribuição de massa garantiria as condições para uma produção em massa, laticínios e carnes passaram a ser transportados, por exemplo, de leste a oeste do território americano, tudo isso garantido por vagões refrigerados. Estava formado o primeiro grande oligopólio que permitiu o nascimento de toda uma estrutura de grandes firmas, as quais passam a se preocupar principalmente com seus concorrentes. O mundo econômico virou um jogo: faço o que posso diante do que você possa fazer em reação. Nesse novo ambiente, Nash, aquele da mente brilhante, muito nos ensinou. Como bons alunos,outros tantos economistas logo, logo criaram novas formulações e avanços. Nascia a teoria dos jogos, cuja importância se pode perceber pelos prêmios Nobel conquistados nessa área. Ora, como podem escritos apresentados até 1883, ano da morte de Marx, se dar conta das grandes transformações que então apenas mostravam seus primeiros contornos, mas que não mais pararam de apresentar novidades técnicas e organizacionais com grandes implicações sobre o mundo social e econômico, tal como se pode verificar nos nossos dias?A mecânica determinística das médias de Marx não apresenta a menor condição de explicar as transformações que a economia e o mundo do trabalho nos trouxe.

Quarto, diante da impossibilidade de alcançar a desejada união, novas ideias apareceram através de pessoas tais como Virgínia Wolf na Inglaterra dos anos 1930, Sartre e Simone Beauvoir na França dos anos 1960, juntamente com outros (Althusser, Marcuse, Lucaks, Gramsci, Foucault etc.) conduziram a esquerda para outras aventuras. Resgatam o lupen proletariado, aquele odiado por Marx. A revolução agora é pensada sob o prisma da cultura.As minorias ganharam relevo. O gênero substituiu o sexo. A ante cristandade passou a ser uma necessidade. Mas isso será estória para uma nova viagem. Nesse momento de conclusão, pode-se apenas afirmar que o capitalismo é cheio de problemas e injustiças, certamente que sim, mas não se pode aceitar que os PeTralhas o piorem ainda mais. Meu Deus, meu Deus, quanto engano e quanta enganação.
 



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