Economia & Negócios

Professor da UFPB analisa aprovação da reforma trabalhista no Brasil

DEPT. DE ECONOMIA


13/07/2017

Em novo texto nesta quinta-feira (13), o professor Paulo Amilton Maia Leite Filho, analisa a aprovação, pelo senado federal, da reforma trabalhista no Brasil. O artigo é fruto da parceria do Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba com o Portal WSCOM.

No texto, ele trata sobre o fim do imposto sindical compulsório e a prevalência do acordo coletivo sobre alguns pontos da lei.

Leia na íntegra:

A reforma trabalhista: Uma perspectiva

Por Prof. Titular Paulo Amilton Maia Leite Filho

A impressa brasileira noticiou que na noite do dia 11 de julho de 2017 o senado federal aprovou a reforma trabalhista. O escopo da reforma foi elaborado pelos técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) ao longo dos últimos 10 anos. Os estudos sobre uma possível reforma trabalhistas foram solicitados no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Concomitante a este, foram também solicitados ao IPEA estudos para uma possível reforma fiscal, incluindo a previdência e os gastos do governo, e nas regras de terceirização da força de trabalho. Os esboços dessas reformas foram apresentados ao governo da presidente Dilma Roussef. No entanto, este governo, embora tenha encaminhado algumas delas, como a terceirização da mão de obra, não teve condições políticas de aprová-las. O governo que a sucedeu deu encaminhamento e logrou êxito em aprovar a PEC dos gastos, a reforma da terceirização da mão de obra e, por fim, a reforma trabalhista.

A reforma trabalhista visa alterar o elemento central da lei trabalhista então vigente no Brasil, também conhecida como Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), promulgada em primeiro de maio de 1943 pelo então ditador Getúlio Dornelles Vargas. No ano de 1941 foi criada a Justiça do Trabalho e o governo Vargas viu a necessidade de consolidar num único documento legal as leis que regiam a relação capital-trabalho no Brasil. Por isso o nome de Consolidação das Leis do Trabalho. O elemento central da CLT é a tutela que o estado brasileiro exerce nas relações entre o capital e o trabalho.

A tutela se estendia as entidades que representavam os trabalhadores e os empregadores. Nenhum sindicato, tanto patronal como de empregados, poderia ser aberto sem a anuência do Estado, representado pela justiça do trabalho. O Estado também proveu o financiamento dos sindicatos autorizados a funcionar através do imposto sindical, que é cobrado compulsoriamente de trabalhadores e empresas. Vale salientar que os sindicatos patronais têm apenas 11% do seu financiamento advindo do imposto sindical. O grosso do financiamento dos sindicatos patronais se dá via sistema S, como são chamados o conjunto de entidade como Sesi, Senac, Sest, Senai, etc.

Feita esta pequena introdução, quero discutir aqui o aspecto mais marcante da atual reforma, segundo meu ponto de vista. Este diz respeito a dois pontos, que ao meu ver estão intimamente ligados. Quais são eles, o fim do imposto sindical compulsório e a prevalência do acordo coletivo sobre alguns pontos da lei.

Quem sabe um pouquinho de história do movimento sindical americano lembra-se que o embate entre trabalhadores e patrões se deu entorno da existência em si dos sindicatos. A princípio não se aceitava a existência dos sindicatos e muitas vezes se recorreu a violência física para impedir o funcionamento dos mesmos. No entanto, depois de algumas alianças que os trabalhadores fizeram que equilibraram o uso da violência, o lado patronal aceitou a existência dos sindicatos e, mais, reconhecia neles os legítimos representantes da classe trabalhadora.

Deste processo de reconhecimento surgiu os acordos coletivos entre os sindicatos e os grupos empresariais. Os trabalhadores individualmente não negociam diretamente seus direitos trabalhistas. Ao invés disto, o sindicato negocia as cláusulas que tem repercussão para todos os trabalhadores associados àquele sindicato. O que vale no acordo tem força de lei, desde que não viole regras constitucionais. Isto teve milhões de consequências, inclusive políticas. A força de negociação dos sindicatos empoderou a classe trabalhadora do ponto de vista político. Este empoderamento levou o capitalismo a ser menos cruel com os trabalhadores e, por que não dizer, com o ser humano.

Também inexiste financiamento compulsório através do sistema tributário. O sindicato tem como fonte de financiamento os pagamentos de seus associados. Aqueles sindicatos que conseguem melhores cláusulas para seus associados nos contratos coletivos têm mais associados. Isto leva a independência do sindicato em relação ao Estado. Também levou a uma competição entre os sindicatos, pois os mesmos disputavam seus associados. Este movimento levou a diminuição no número de sindicatos. Um número menor implicou em maior poder de pressão dos sindicatos sobreviventes que, por sua vez, levou maior poder político.

Esta é a mesma lógica da atual reforma trabalhista. Acabar com a tutela do Estado nas relações entre o trabalho e o capital. Permitir que os sindicatos de trabalhadores negociem diretamente com os representantes patronais e que o resultado da negociação tenha força de lei, desde que não viole nenhuma cláusula constitucional.

Evidente que este processo não será fácil nem rápido. Será um longo aprendizado para ambas as partes e, Deus tomara, isento de violência física. Do lado dos trabalhadores muito provavelmente teremos o fechamento de vários sindicatos. Hoje o Brasil conta com 11.000 sindicatos registrados no ministério do trabalho, dos quais 27,5% não tem sede nem trabalhadores vinculados, ou seja, existem apenas no papel para receber o imposto sindical. Pode ser também que aconteça um movimento questionando a eternidade no poder de algumas lideranças sindicais.

Com o fim do imposto sindical, as lideranças dos trabalhadores podem se sentir estimuladas a questionar o financiamento dos representantes patronais. Como dito acima, os sindicatos patronais têm como principal fonte de financiamentos o sistema S e sua prestação de contas deixa muito a desejar do ponto de vista da transparência.

O processo de judicialização das relações entre o capital e o trabalho tende a diminuir. Ai, a meu ver, esta o grande perigo de a reforma ser barrada nas instâncias superiores do judiciário brasileiro. Imagine que vários cargos da justiça do trabalho podem ser extintos com a diminuição das demandas judiciais. Não é à toa que as associações de juízes e promotores do trabalho estão vociferando contra a reforma. Vale salientar que a justiça do trabalho é uma jabuticaba que só existe no Brasil. E a mesma não vai ficar olhando parada o fim.

Enfim, a reforma trabalhista tem uma perspectiva de a longo prazo mudar as relações entre o trabalho e o capital e empoderar politicamente os sindicatos dos trabalhadores, se no curto prazo aqueles que perdem importância com a sua aprovação não a mate. 

 



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