Educação

Profissionais procuram curso de oratória para improvisar na vida profissional

EducaÇão


01/06/2013



 A palavra é "amor". Você vai improvisar durante dois minutos. O comando é dito pela professora, e os dois homens em um pequeno palco começam a discorrer nervosamente sobre o tema. A expressão corporal muda o estado de conforto. Agora eles estão tensos e, mesmo sem perceber, balançam de um lado para o outro, para frente e para trás, enquanto procuram por palavras.

A cena é parte de um curso de oratória do Clube da Fala, no Rio de Janeiro, em um dos diversos exercícios que os alunos fazem para desenvolver a habilidade de improvisar na retórica. A sala vai enchendo progressivamente, e chega a vez de novos pupilos encararem o palco.

Primeiro sobe um rapaz de 16 anos, que precisa passar em um exame de proficiência em alemão e, tímido, teme não conseguir por causa da avaliação oral.

– Nós demos a tarefa para ele contar histórias na sala de aula e de começar conversas com estranhos no metrô – conta Laila Wajntraub, a professora do curso.

Preparação
Fonoaudióloga e especialista em oratória, Laila pede a uma advogada aspirante a filósofa que se junte ao garoto no palco e descreva o medo de improvisação que a levou a buscar as aulas:

– Meu coração dispara e me sinto como se tivesse subido uma escada de muitos degraus, fico ofegante.

O improviso, seja ele no discurso, na escrita, na prática profissional, no cotidiano cidadão ou em manifestações artísticas, amedronta muita gente, não só os tímidos. Paira no imaginário coletivo a imagem de um orador eloquente que possui as palavras certas na ponta da língua, como se detentor de um dom. A ideia de comunicar-se com eficiência sem preparação prévia é, no entanto, uma falácia.

Especialistas mostram que, por trás da maioria dos improvisos de sucesso, há estudo, planejamento e preparação, que foram incorporados à bagagem de conhecimentos do orador ou redator e antecedem o momento da improvisação. É em busca disso que cada vez mais pessoas têm se inscrito em cursos de oratória, tea-tro e comunicação empresarial.

Sem ilusão
– Na vida nós improvisamos diariamente, por mais que programemos nosso dia. O improviso traz a possibilidade de conviver com o imprevisto com mais naturalidade, em vez de ficarmos bravos -, diz o palhaço e ator Márcio Ballas, diretor artístico do Clube do Humor, que oferece cursos de improvisação para amadores em São Paulo.

Os alunos, na maioria, não são atores nem desejam ser, mas buscam desenvolver a habilidade e o jogo de cintura para improvisar.

– O curso ajuda as pessoas a serem mais disponíveis com o que ocorre com elas e aprenderem a jogar com isso – explica Ballas.

Renato Raoni Affonso é uma dessas pessoas que buscaram um curso para desenvolver sua capacidade de improvisação, ofuscada pelo medo de se expor em público. No seu caso, a urgência de trabalhar essa faceta surgiu por conta da necessidade de defender sua dissertação de mestrado.

– No curso aprendi técnicas para falar com mais segurança. Por mais que você tenha uma fala decorada, não vai lembrar de tudo. Então é normal que tenha de improvisar – afirma o aluno do Clube da Fala.

Deslize incorporado
A defesa da dissertação foi um sucesso, e Renato, agora mestre em Ciência e Tecnologia Nucleares pelo Instituto de Engenharia Nuclear, afirma que o improviso surgiu naturalmente em seu discurso porque ele já havia praticado muito.

Sandro Huguenin, sócio de Laila no Clube da Fala, comenta que essa habilidade de improviso está muito mais conectada à realidade do mercado de trabalho e das relações pessoais do que à ilusão de que tudo pode ser 100% previsto e preparado.

– Em uma reunião de trabalho, por exemplo, o profissional vai ser constantemente questionado sobre assuntos com os quais não necessariamente contava – avalia Sandro.

O compositor Sérgio Kafejian, professor de música na Faculdade Santa Marcelina e autointitulado "improvisador", observa que há lições que a música ensina sobre a improvisação e as pessoas podem levar para suas vidas. Afinal, assim como no registro oral e escrito, o improviso na música tem à disposição uma série de sonoridades (no lugar de palavras) que precisam ser articuladas.

– Você estuda o improviso com a prática. Na hora da improvisação, cada músico chega com um arsenal próprio que, quando entra em contato com o do outro, cria coisas imprevistas com as quais eles precisam decidir na hora o que fazer. Acho muito interessante na improvisação esse poder de decisão rápido. Você sempre precisa resolver algo naquele momento.

Em público
E o que fazer ante um deslize ou um discurso desafinado? Incorporá-lo.

Segundo Kafejian, pequenos erros na verdade não são erros, mas formas de potencializar a improvisação. O "destemperamento", diz ele, faz parte da linguagem, e precisa ser absorvido e transformado de algo inesperado a esperado.

O palhaço Ballas trabalha com o erro como um dos princípios da improvisação. Segundo ele, quando alguém faz uma tentativa e isso dá errado, precisa ver o resultado daquilo e alterar a rota, levando o deslize em consideração.

– O público adora quando a cena dá errado, vai ao delírio, porque quer ver essa capacidade de adaptação de quem está se apresentando.

Isso não é uma realidade apenas nos palcos e picadeiros. Ballas conta que muitos de seus alunos fazem o curso porque desejam expressar-se e improvisar com naturalidade em público.

– Em uma palestra, se a pessoa erra, fica mal, pede desculpa, e aí fica tensa e o público, vendo-a tensa, fica tenso também. A pessoa precisa brincar com aquilo, autorridicularizar o episódio, porque então o público vira seu cúmplice – ensina o ator.

Ballas fará parte neste maio do espetáculo Caledoscópio, no Tuca Arena (São Paulo), com foco na improvisação. Nos primeiros dez minutos de peça, o elenco colhe informações da plateia, e em seguida apresenta uma peça baseada nesses dados, feita exclusivamente sobre e para aquele público.

Vaidade do erro
O grande problema dos que querem aprender a improvisar, segundo a psicóloga Joana Barbosa, é não lidar bem com a imperfeição. Atriz, diretora e palhaça, Joana é também professora do curso O Clown Dentro de Mim, que atende muita gente que não é ligada às artes cênicas.

– Quanto mais a pessoa se desapega do acerto, mais consegue improvisar – afirma Joana.

A psicóloga avalia que, ao se trabalhar algo indefinido, há o risco de errar, e as pessoas "ficam vaidosas em relação ao erro".

– Certa vez, um senhor de mais de 70 anos veio fazer o meu curso, e dei um tema de improvisação. Quando ele foi apresentar, vi que começou a andar de maneira diferente e achei estranho. No fim da cena, ele me mostrou que tinha cortado profundamente o seu pé durante a cena, mas improvisou tão bem que achamos que fazia parte do personagem.

No curso, Joana trabalha com a improvisação como princípio essencial do palhaço. Ela observa que esse é um personagem que vive de imprevistos, da prática de resolver problemas que se apresentam na hora. E isso é uma habilidade da qual todos precisamos.



Os comentários a seguir são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.
// //