Em determinado momento da vida a gente chega à conclusão de que é preciso “sair de baixo da saia da mãe”, ganhar o mundo, dar rumo à vida de forma independente. Em “Trem da minha vida”, gravado ao vivo por Jorge Vercillo em 2008, ele fala exatamente dessa decisão, mas aproveita para fazer uma declaração de amor e agradecimento à sua mãe por ela ter lhe preparado para enfrentar os medos naturais que a vida oferece.
“Já vou, eu vou, ó mãe!/Eu vou no trem da minha vida/Chegou a hora da partida, ó mãe!/Não quero choro nem despedida”. A hora de cortar o cordão umbilical, sair de casa. Na música ele narra a comunicação à mãe de que está partindo. O “trem da vida” já anunciou que está pronto para seu embarque, em direção a um novo tempo, um novo mundo, onde poderá trabalhar sua independência emocional. No entanto, pede que esse instante não seja ocasião para tristeza, prantos, adeus. Até porque ali acontece a separação física, mas nunca haverá a separação espiritual. O vínculo de afeto, carinho e amor, entre mãe e filho nunca se desfaz, sejam quais forem às circunstâncias.
“E o mundo que eu levar/Será tudo que você me ensinou/Muita garra pra lutar, honestidade/Que eu só devo ao seu amor”. Fala dos ensinamentos recebidos, desde o tempo em que era criança, preparando-o para o caminhar sozinho no futuro. A lição de que é necessário ser, antes de tudo, um corajoso, determinado a alcançar tudo o que deseje, mas de forma responsável e honesta. Ter garra para lutar, nunca desistir. Não ter receio de encarar de frente os obstáculos e problemas que venham a surgir. Só um amor incondicional põe em prática essa doação sem limites, ofertando sua própria vida como exemplo a ser seguido. Assim registrava o reconhecimento da importância dela em sua vida e declarava todo o seu agradecimento por tudo que aprendeu com ela.
“E tudo o que eu ganhar/Terá sempre o seu carinho, a sua mão/Será sempre fruto desse corajoso/E enorme coração”. Não tem dúvidas que as conquistas que aparecerão a partir do seu desligamento familiar materno, serão efeitos do que conseguiu aprender com ela. Em cada ação, em cada atitude, em cada avanço, estará a presença dela, como se estivesse ao seu lado compartilhando emoções e dores. Afinal as mães têm o poder quase que divino de, mesmo distantes, perceberem alegrias, preocupações, angústias e ansiedades do filho.
“E quando menos esperar/Eu volto pra te ver e te abraçar/Eu volto pra nunca mais sumir/Nem ficar sem saber de ti”. Como se refere na primeira estrofe da canção, não é uma despedida definitiva, é um “até logo”. Então que ela saiba que no menor espaço de tempo possível ele estará de volta para reviver a satisfação de poder vê-la e abraçá-la. E a sensação sempre será de que nunca vai se afastar por completo. Onde estiver haverá de procurar saber notícias e, de longe, cuidar de sua saúde e da sua felicidade, na retribuição do quanto recebeu na infância e na adolescência.
“Mas tenha fé, eu vou voltar/Mais pleno do que possa imaginar/Agora dá um beijo e abençoa/A tua cria vai voar”. Pede que ela não tenha receio, porque nele se afirma a convicção de que ao voltar estará muito mais realizado, muito mais completo na construção de sua personalidade, muito mais consciente de suas responsabilidades e obrigações. Mas ao dar o primeiro passo em direção à vida autônoma precisa receber o beijo mais especial e mais abençoado, como se estivesse sendo entregue, sem o seu acompanhamento diário, aos cuidados de Deus. A cria ganhou asas e vai voar.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.