Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

MEIO SÉCULO!


17/01/2004

Foto: autor desconhecido.

`Por favor, não retoquem minhas rugas. Levei muito tempo para construí-las.´
Anna Magnani

Nos tempos das plásticas, do silicone, das benesses de um corpo sarado e da supremacia da juventude, essa frase da maravilhosa atriz Italiana, deve soar como algo ultrapassado.

Quando completei vinte anos, tive uma grande sensação de perda. Acho que da inocência. E as pessoas me reforçavam isso. Vinte anos! Exclamavam como se eu já tivesse perdido o meu reino anunciado?! Na década dos vinte já estava casada, descasei também, me formei, ganhei os mundos, experimentei de um tudo e vi todos os navios que passavam no meu horizonte. Foi também nos 20 que pari e descobri as delícias e as contradições de ser mãe.

Depois vieram os trinta, e pensei: Nossa eu era tão jovem e não sabia! Continuaram a me dizer: Agora tu és uma balzaquiana, com todo o peso, o desgosto, o ultraje que os trinta anos de Balzac poderiam representar. Nessa década fiz as pazes com o amor, tive outro filho, construi uma profissão, comecei a escrever, perambulei por terras Incas e Galesas, andei de Gôndola em Veneza, de balsa pelo rio Negro, e de jangada em praia formosa.

Experimentei os grandes mergulhos, uns em águas claras, outros em águas turvas, negras mesmo, enfim tive os primeiros cabelos brancos e apresentei-os à Henna vermelha. Fiquei a procurar toda a `velhice´ que me diziam que eu já tinha, e não via nada…Talvez procurasse por algo como disse Cecília Meireles:´- Em que espelho ficou perdida a minha face?´

Assim se passaram dez anos e bem vindo os 40! De novo me diziam: IH! Agora foi, acabou-se tudo. Quarentona! Rugas! Corpo flácido! Não vale duas de 20. Li dois livros fundamentais para fortalecer a identidade da mulher madura: A Idade da Loba, de Regina Lemos e Mulheres que Correm com os Lobos, de Clarice Pinkola Estés. Esse livros me mostraram a verdadeira face de nós mulheres, seja de 20 ou de 40. A verdadeira natureza da mulher selvagem e a sua força interior e por que não exterior. E prometi a mim mesma que jamais ninguém me falaria dos meus anos e muito menos dos meus doces enganos.

Da minha idade sei eu! E os vincos que me surgem são sim a minha história. Se é uma história boa ou ruim, paciência! Foi a que fui capaz de construir. E ninguém mais.

Agora que faço 50, não acredito mais no que me dizem! E nem quero Balzac, nem ninguém, a proclamar: Ah! Você foi tão linda…como se a minha vida já tivesse escorregado pelo ralo; como se a beleza só pudesse ser vista, quantificada e decifrada. A beleza é algo tão híbrido…tão fugidio…e tão mais dependente dos sentidos.

Todos nós temos uma, ou muitas. Que surge em tantas marés ao longo do tempo…É claro que já me chamam de Senhora já há algum tempo, e já não tenho tanta intimidade com a mini-saia. Sou do tempo das saias longas. Sou hippie-chic! Se linda ou não, o problema ou a solução espero não estar só e exclusivamente no viço da minha pele, mas em formas mais sutis como num doce sorriso, na capacidade de deixar o rio correr, na exuberância diante da vida e na dança ao longo das horas. E quanta às marcas que a vida selou no meu corpo, estas são meu grande tesouro, portanto mais respeito com elas!

Meio século de rompantes e calmarias; de lágrimas e gargalhadas, de sonhos e sustos…Que delícia que é a vida. E haja pastéis de nata…e um `Poema Madurinho´ de Flora Figueiredo, para dar conta dos parabéns prá você!!!!

Meu espelho anda ficando grisalho
Vou colocá-lo atrás da porta
Para que reflita com cuidado
O abusado só vem cometendo ato falho


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