Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

Bola Dividida


07/02/2018

Foto: autor desconhecido.

Outro dia, um amigo do face, me disse que eu não entrava em bola dividida, numa referência às brigas do facebook. Não achei um elogio pois brigar pela bola é urgente para se fazer um gol. E Fiquei a pensar. Realmente, no facebook e no espaço público em geral, sou tímida. Mas não que essa timidez signifique sem posição, ou em cima do muro. Tento, mesmo mais vagarosamente, falar do que acho, sinto, ou resisto. Na maioria das vezes essa opinião pública tem raízes no privado. Mas, me achei quando as mulheres ditaram que o privado era político! Em casa, ah! No espaço doméstico, sou arara, embora isso também atrapalha. Venho tentando aprender e lidar melhor com o falar baixo, e o silêncio, armas tão ou mais poderosas que o falar. Não o silêncio vindo da opressão, mas o silêncio por escolha e com a sua dita eloquência.

Essa da timidez no espaço público, vem dos tempos ancestrais. Reconheço. E de casa também, onde em tempos de opressão, menina não tinha vez, e ouvi muito, para ficar calada. Com a vida, aprendi a falar alto, o que quase sempre é ruim, mas por vezes necessário, e a tomar as rédeas dos meus desejos e falas. O meu lugar de fala! O que é bom. Ótimo!

Em tempos sombrios da Política, confesso que fiquei acabrunhada. De tristeza, de frustração, de espanto, de indagações, dúvidas, e raivas tantas tantas. Com Juca ao meu lado, era tudo tão mais fácil. Pois ele, um Ser Político autorizado e capacitado na vida (pelos estudos e pela trajetória), estava sempre a resenhar e trocar comigo, me questionar, me jogar no abismo e a exigir indiretamente sobre eu e as minhas circunstâncias, não só na Política, mas na vida. Aprendi muito. Inclusive a sair do meu casulo confortável de menina provinciana/rebelde com e sem causa. Ouvi muito dele : “De perto ninguém é normal; Pão pão queijo queijo; aos inimigos? Nem a lei!; Cabrito bom é cabrito que berra; Ah! A natureza humana.” E com ele aprendi a ser mais humana, demasiada humana. E mais generosa. Uma bela herança. Dentre tantas.

Nos últimos episódios do julgamento de Lula, mantive alguns distanciamentos. O meu lado passional na vida privada, ficou atônito no público. Particularmente, identifico-me com os que defendem o ex-presidente Lula. Admirava-o sempre, e com Juca, conheci-o mais de perto, e as artimanhas do Poder. Se o triplex era dele? Não sei ! Já que o ato de ofício, está nebuloso. Mas não sou inocente de ver que, para Governar, o PT também teve lá as suas responsabilidade e algumas práticas se fizeram presentes.

Mas pior que isso, muito muito pior, é obsevar as pessoas que odeiam o PT e Lula. A questão de classe saltitando dos confins de um brasileiro que tem horror de pobre que ascende. E com essas pessoas não me identifico nem um tico. Não sinto em nenhum momento o pedido de socorro por tempos melhores, mas os ranços seculares contra um operário que um dia comprou um vinho importado. São pessoas que no facebook ou em outras mídias, destilam o seu ódio contra coisas que me são caras a vida toda. Então, nas coisas que não sei, ou naquelas que tenho lá minhas dúvidas, prefiro Chico Buarque, amigos da vida toda, anônimos que admiro, advogados amigos e competentes, procuradores que tem gabarito para opinar, e outras pessoas que defendem a melhoria, e um governo popular, do que assistir placidamente gente dos porões da ditadura, ditar os horrores a que tenho visto.

Recorro a um querido da intimidade que me disse particularmente: “O Direito possui uma linguagem e mecanismos e funcionamento próprios e que não podem ser subvertidos pela moral ou pela política. É muito difícil discutir a condenação de Lula, pois é um caso super complexo e que envolve a discussão de difíceis teorias jurídicas. Daí ser complexo ir aos extremos”. Até concordo. Mas quando se vê outros processos serem arquivados e a presteza que adiantam o que é de interesse político, levanta-se a lebre. Uma questão arriscada para nós leigos.

Na Folha de São Paulo li, Mario Cesar Carvalho: “Os Juristas se concentram nos fatos relativos ao triplex e passaram como um foguete sobre as questões de direito, as mais controversas”

Em Migalhas – Fábio Tofic Simantob diz: “Como o réu é culpado, não é preciso provar a culpa. Ato de Ofício é o ato próprio da função pública que, por vantagem econômica indevida, o agente aceita praticar. Questionável, reprovável, condenável moralmente um ex-presidente aceitar de presente um mimo de uma empreiteira? Se for verdade, nos parece censurável. Mas não crime, não pelo menos de acordo com a lei brasileira.”

Gonzaga Rodrigues no seu maravilhoso artigo – Uma Questão de Classe, União 27/01/2018 fala com propriedade: “Lula havia de ser condenado e, só por milagre, não voltar à prisão de onde saiu, na ditadura, para ser cultivado e convertido numa das maiores lideranças dos nossos tempos republicanos.”

São muitos os sites de juristas e especialistas do Direito. E quanto mais li, mais confusa fiquei. Pois as leituras, interpretações, e brechas, não cabem no conhecimento dos fora da área. O que só constata que, o discurso, as várias leituras e interesses, sim politizou o judiciário e vice versa. A subjetividade do processo e do momento político, vão muito além do que qualquer traço de corrupção, propina ou culpabilidade. Mas de tirar Lula da cena política brasileira.

Diante de toda essa complexidade do momento, me dou o direito de opinar pouco, pensar mais, e claro, me identificar com aqueles que a vida toda defenderam um país mais justo e igualitário. Como também me distancio daqueles que, chamaram Lula de metalúrgico boca, que recriminaram as políticas sociais, a mobilidade social, os aeroportos cheios da pobreza, a ousadia do garçom que virou advogado, da ascensão dos negros, das leis das domésticas, que deu o sonho ao proletariado. Concordo sim, que esses condenam Lula não por corrupção, mas por ele fazer história e acreditar na igualdade como bem disse Herton Gustavo Gratto, no texto – “Fim da linha pra você, ex-presidente ladrão.”

Voltando à bola dividida, em alguns momentos da vida dei pancadas, me machuquei, botei gelo nas dores, mas hoje, confesso que sim, sou mais observadora dessa mesma natureza humana, deixando para aqueles mais ferozes, as brigas e enfrentamentos , o que as minhas pernas talvez não tenham mais a abertura necessária para os pulos do gato.

A vida é um jogo. Mas esse jogo pode não ser futebol americano ou hóquei no gelo! pode ser um jogo de sinuca, xadrez, onde o cheque mate nem sempre é barulhento, ou agressivo. Lembro do meu pai, um estrategista, no jogo. Quem que pode pensar o imponderável? O vociferar é num outro tom. E o silêncio? Tem sim significado, com bolas divididas ou nocauteadas.

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa 2 de fevereiro, dia de Festa no Mar
 


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