Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Política

A truculência voltou, lamentavelmente


26/08/2020

Na imagem o presidente da República Jair Bolsonaro

Durante dois meses assistimos a versão “paz e amor”. Durou pouco. Compreende-se ao analisar a personalidade da figura pública a que estou me referindo, cujo nome não há necessidade de citar, todo mundo sabe quem é. O personagem objeto deste comentário traz no seu histórico político a marca da beligerância, é um homem afeito aos conflitos, tem o espírito inclinado a viver em permanente guerra. Os inimigos que provoca para o combate variam de acordo com as conveniências. Muito difícil para alguém que durante toda a vida agiu assim, controlar seus ânimos, adotando uma postura de equilíbrio emocional.

Na volta da truculência o adversário escolhido foi a imprensa. Quem tem vocação para o autoritarismo detesta ser questionado. Muito mais quando se vê numa encruzilhada, sem ter como oferecer respostas convincentes a perguntas áridas. A brandura que tentava demonstrar é substituída pela arrogância, a grosseria, o desapego à obrigação de prestar contas de seus atos. O autocrata não sabe conviver com a divergência ou a cobrança de transparência nas suas ações. A estratégia é partir para a tentativa de intimidar os interpelantes, querendo vencer pela imposição do medo, apoiado no exercício do poder.

Ainda que não tenhamos nos surpreendido, ficamos com um sentimento de decepção porque acreditávamos que, enfim, passaríamos a experimentar um tempo de convivência pacífica no campo político nacional. Na democracia as diferenças de pensamento alimentam o sadio debate das ideias, na busca do encontro das soluções para enfrentamento dos problemas que afligem a nação. Lamentavelmente, a chama da pugnacidade volta a ser acesa com toda a força. Impressiona a sua incapacidade em coexistir num ambiente de paz. Não consegue entender que a sociedade tem o direito de ter livre acesso à informação e à opinião, tarefa que cabe ser exercida pelos profissionais do jornalismo. Opta por, pela agressão gratuita, amedrontar na intenção de silenciar o jornalismo crítico.

Esses arroubos frequentes da mais importante figura política brasileira na atualidade, embora não causem mais espanto em razão da compreensão de que se tratam de uma característica de sua personalidade, revelam-se manifestações de incivilidade impróprias para quem ocupa cargo tão destacado na estrutura administrativa do país. Atenta contra o decoro exigido pelo exercício do cargo em que está colocado. O mais preocupante é que estimulam comportamento idêntico dos que apaixonadamente o seguem. A ordem democrática é atacada de morte por esses impulsos autoritários.

Esta não é simplesmente uma crítica política instigada por discordância ideológica, mas sim um alerta para o risco de acharmos que tudo isso deva ser considerado como normal no comportamento de um líder político, eventualmente assumindo a responsabilidade de dirigir a nação. O que se espera de um estadista é a habilidade de comunicação e de unir as pessoas, de forma a conquistar o respeito dos seus comandados. Alguém versado nos princípios e na arte de governar, liderando com sabedoria e sem distinções partidárias ou ideológicas.

Não fui seu eleitor, e dificilmente o serei algum dia. Porém, ele é o presidente de todos os brasileiros, o que me dá o direito de, respeitosamente, reivindicar um posicionamento de equilíbrio emocional que possibilite a instalação de um clima civilizado na convivência de todos os brasileiros, seja qual for a posição social ou política em que se situem. Num ambiente de permanente belicosidade, provocada por quem deveria dar o bom exemplo, marcharemos celeremente para a desordem social, onde compatriotas vivam se digladiando por conta de incompatibilidades políticas. O apelo é de que, mesmo que contrariando seu estilo pessoal de agir e de pensar, retorne à versão “paz e amor” que estávamos experimentando nos últimos sessenta dias. Para o bem da nação e fortalecimento da democracia.


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