Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

A INFLAÇÃO JURÍDICA


14/11/2011

Foto: autor desconhecido.

Impressiona a quantidade de dispositivos legais criados no Brasil. Cresce a cada dia o número de novas regras e novas matérias de regulação buscando disciplinar a vida em sociedade, causando uma verdadeira confusão e inaplicabilidade junto à população, que, na sua grande maioria, sequer toma conhecimento delas. Leis elaboradas, muitas das vezes, de forma aleatória, incompreensíveis, absurdas, desnecessárias. Ineficazes na prática.

A Lei de Introdução ao Código Civil em seu Art. 3 estabelece que “ninguém se escuse de cumprir as leis alegando que não a conhece”. Inadmissível exigir do cidadão comum plena conscientização das leis diante da infinidade de normas existentes. Nasce aí uma distância incontestável entre o direito e a realidade. A proliferação de normas provoca uma crise de legalidade e torna muitas das leis desvalorizadas.

A começar por nossa lei maior: a Constituição Federal. No Brasil temos. em média, uma nova constituição a cada vinte anos. Essas constituições sofrem uma quantidade enorme de emendas e remendos, tornando-as uma colcha de retalhos. A Constituição de 1988 já recebeu mais de quarenta emendas ao seu texto. E o que nos deixa mais preocupados é que temos uma Constituição que não cumpre o que promete. Basta citar alguns dos preceitos nela contidos: “a saúde é direito de todos”, “os trabalhadores percebem salário mínimo capaz de satisfazer às suas necessidades vitais e às de sua família” e “deve existir repressão ao abuso do poder econômico”. Efetivamente não é isso que vemos no dia a dia do brasileiro.

Existem mais de duzentas mil normas federais vigentes no Brasil, entre leis, decretos-leis, instruções normativas, comunicados, portarias e resoluções. A maioria nasce em conflito com a Constituição, portanto, não tem efeito prático na vida do cidadão. Essa produção ilimitada de dispositivos legais leva à incapacidade de assimilação da população, fragiliza a própria função dessas leis e abre uma extraordinária capacidade de interpretações e fundamentos jurídicos divergentes. Além disso o judiciário tem elevada a demanda dos que buscam solucionar os conflitos em que estão envolvidos, concorrendo para a morosidade de suas decisões, conseqüência das querelas e manobras jurídicas que a legislação permite.

Regular a vida social pressupõe o objetivo primeiro da aplicação das leis. É preciso, portanto, que atinjam a sua finalidade, observadas conscientemente por seus destinatários. Aos legisladores brasileiros cabe a responsabilidade de formatar leis tecnicamente bem elaboradas, procurando satisfazer a necessidade de melhoria das condições sociais e estabelecendo mecanismos de ampla divulgação a fim de que o exercício de cidadania seja mais facilmente praticado pela população a partir do conhecimento dos seus direitos e deveres. Acredito que essa consciência política por parte dos parlamentares inibirá a criação de leis que tenham dificuldades de sua aplicabilidade, diminuindo assim essa inflação legislativa que ataca o bom ordenamento jurídico do país.

 

 


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