Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Paraíba

A igreja do Rosário


10/10/2020

O historiador, produtor cultural e advogado Rui Leitão

Publicado no jornal A UNIÃO, edição de sábado (10).

A principal referência do bairro de Jaguaribe, onde vivi parte da minha vida de adolescente, ainda é a Igreja do Rosário. Trata-se de um belíssimo projeto arquitetônico com forte influência alemã, em razão da origem dos frades responsáveis por sua construção.  No seu interior possui colunas revestidas de mármore escuro, oferecendo uma beleza que impressiona.  Sua edificação foi concluída por volta de 1930.

O arrabalde cresceu no seu entorno. A vida religiosa, cultural, educacional, esportiva e social, acontecia nos seus arredores. O templo acolhia a comunidade católica do bairro nas missas celebradas nos sábados à noite e domingos pela manhã. A juventude preferia comparecer às cerimônias noturnas dos sábados, num excelente pretexto para a paquera e os namoricos. Essa frequência à Igreja dava a impressão que éramos mais religiosos do que a geração atual.  Aproveitávamos a oportunidade para, antes e depois da missa, nas reuniões em frente à Igreja, tomarmos conhecimento da programação social do fim de semana. De lá saiamos em grupo para os “assustados”, festinhas organizadas em residências próximas.

O cine Santo Antônio, que ficava ao lado direito, tinha a preferência da garotada. Os frades, seus proprietários, nunca permitiam que lá se exibisse nada que pudesse figurar como proibido para menores de dezoito anos. Normalmente eram filmes de aventuras e educativos. Lembro que lá assisti “Marcelino, pão e vinho”, uma produção de apelo religioso que fez grande sucesso na época. Mas também, embora sob forte vigilância dos administradores (o gerente era Flávio Coutinho), o ambiente escurinho do cinema ajustava-se aos interesses dos casais enamorados.

Na sua frente se instalou a feira livre, funcionando nas quartas-feiras, onde os habitantes do bairro adquiriam seus mantimentos, principalmente de alimentação. Acompanhei minha mãe várias vezes na tarefa de fazer a feira semanal para ajudá-la a transportar as compras, o que se constituía um fardo pesado para a minha compleição física franzina.  Hoje, com a construção do Mercado Público Municipal no final da Rua Primeiro de Maio, esse movimento comercial para lá se transferiu.

Por trás os frades edificaram um equipamento esportivo que propiciava a realização de atividades físicas dos jovens que integravam uma agremiação chamada “Cruzada”, comandada pelo Frei Albino. O local passou a ser utilizado por todos os que gostavam de praticar o futebol. Lá surgiu o Estrela do Mar Esporte Clube, que viria a ser Campeão Paraibano de Futebol em 1959, último ano em que do certame participavam apenas equipes da capital.

No mês de outubro ocorria a festa da padroeira, com seu ritual religioso, mas também com sua programação profana. Parques de diversão infantil eram instalados. No pavilhão central aconteciam as quermesses, com leilões, bingos e sorteios, cuja receita ajudaria a manutenção das atividades da Paróquia. Rapazes e moças trocavam bilhetinhos com declarações românticas. Mais na frente funcionava o que chamávamos de “frasqueira”, barracas com objetivos comerciais, onde não havia restrições ao consumo de bebidas alcoólicas.

Na torre da Igreja conseguíamos ver, á distância, a hora que seu relógio exibia. Ali também eram tocados os sinos que anunciavam as missas.

Não há quem, tendo morado em Jaguaribe, não guarde gostosas recordações da movimentação social e religiosa da Igreja do Rosário.

Rui Leitão


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