Saúde

Check-up médico: bateria de exames não susbstitui análise clínica

Clpinica


13/09/2013

 Visualize o cenário: o paciente entra no consultório e diz "Doutor, estou ótimo. Vim só para um checkup e queria fazer todos os exames que há", ou, o paciente nada pede, mas recebe um pedido padrão de 40 exames. Já aconteceu com você? A dúvida aqui é: esses exames realmente melhoram a quantidade e qualidade de vida? Minha opinião é que ocorre exatamente o oposto e para entender por que, vejamos como raciocina o médico.

A primeira ação de um médico ao receber um paciente é perguntar sua queixa e tentar, por meio da história e do exame físico, compreender a origem desta. Ao fim dos procedimentos, ele muito provavelmente já alinhavou várias hipóteses diagnósticas cabendo-lhe agora a tarefa de testá-las em ordem decrescente de probabilidade, até uma se provar correta. É nesse momento que o exame entra como o instrumento utilizado para ajudar a confirmar ou descartar uma hipótese – e é somente nesse contexto que ele tem sentido ou relevância. Quando o médico pede um exame, ele já sabe qual conjunto de resultados afirmaria ou negaria suas suspeitas. Por conseguinte, exames dissociados de uma hipótese são ininterpretáveis, não informativos e perigosos.

Dentre 40 exames, é inevitável alguns estarem alterados. Porém, exames alterados não refletem obrigatoriamente a presença de doença. Cabe ao médico fazer a conexão no contexto de sua hipótese diagnóstica. Ao mesmo tempo, por mais inexplicável que seja esta alteração, é muito difícil o médico ignorá-la. Então, o exame não apenas consumirá parcela significativa da atenção do médico, mas também desviará o raciocínio clínico numa direção improdutiva, motivando mais exames para tentar explicar o inexplicável e irrelevante. Estes, por sua vez, indicarão mais desvios, perpetuando uma confusão que atrasa e dificulta o diagnóstico correto.

A essência da boa saúde é a prática regular de bons hábitos, e a essência do diagnóstico é a história e o exame físico. Basear sua saúde em exames seria fazer como diz o chiste que afirma que para garantir sua segurança aérea, você deve levar consigo a própria bomba, pois a chance de haverem duas bombas no mesmo vôo é insignificante. É uma ilusão de segurança que pode te prejudicar, pois exames alterados produzem mais exames e procedimentos que te exporão a riscos e complicações desnecessários e indesejáveis.

É por isso que vosso papel como bom paciente é escolher bem seu médico de confiança, alguém com quem você possa dialogar abertamente, cujas atitudes façam sentido e deixá-lo trabalhar. E o papel do médico é sempre se lembrar da frase que seus mestres tanto martelaram durante sua formação: "a clínica é sempre soberana, portanto trate o paciente, não o exame". Qualquer outra abordagem é pegar um atalho para o inferno.



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